Joe Tang

Vencedor do Prémio Literário de Macau e o Prémio de Novela de Macau, Joe Tang é escritor e crítico de arte. Assinou vários romances, incluindo The Floating City e O Assassino, traduzidos para Inglês e Português. Publicou também peças de teatro, entre elas Words from Thoughts, Philosopher’s Stone, Journey to the West, Rock Lion, Magical Monkey e The Empress and the Legendary Heroes.


Ambiente literário

2a edição | 02 2015

“Como promover o desenvolvimento da literatura local?”, “como incentivar os hábitos de leitura em Macau?”, “como melhorar a qualidade de escrita dos jovens?”. São estas as questões dominantes nos eventos literários a que tenho assistido recentemente em Macau. Tendo em conta a dimensão do território, a qualidade e quantidade das obras de literatura locais são relativamente boas mas, mesmo assim, a visibilidade dessas obras é quase nula. O mais frustrante é assistir ao desaparecimento sucessivo das poucas livrarias de Macau, consequência do aumento exponencial das rendas dos imóveis nos últimos anos. No entanto, quanto mais difícil se torna a situação, maior deve ser o nosso esforço em tentar encontrar soluções para reanimar a cena literária de Macau e despertar um maior interesse por ela.


Podemos começar por nos perguntar se Macau tem um “ambiente literário”. É um conceito bastante abstracto e de difícil definição, mas se olharmos com atenção e estivermos atentos a certos sinais, é-nos fácil perceber se um local tem uma certa atmosfera literária ou não. Estão os meios de comunicação interessados no lançamento de um livro, no anúncio de um prémio literário ou no surgimento de um novo escritor? Os membros do Governo ou os líderes de opinião recomendam as suas leituras publicamente? É usual vermos pessoas com a cara enfiada num livro nas paragens de autocarro ou em cafés? No final de 2014, em resposta à iniciativa Small Business Saturday, o Presidente dos EUA, Barack Obama, visitou uma livraria independente com as suas duas filhas. Os 17 livros comprados pelo presidente foram amplamente divulgados pelos meios de comunicação. Por outras palavras, a criação de um ambiente literário não depende totalmente da existência de políticas governamentais ou investimentos na promoção da leitura. Ler é um hábito e uma iniciativa pessoal que, quando visível, tem a capacidade de influenciar outros a fazerem o mesmo.


A Eslite, uma cadeia de livrarias de Taiwan, está empenhada a redefinir o conceito de livraria − não só abriu uma livraria em Hong Kong, onde o metro quadrado vale ouro, como entrou no mercado do Interior da China, altamente competitivo. Não admira que tenha chamado a atenção da CNN, que publicou um artigo intitulado “Nightclubs for literature? Why bookselling is booming in Taiwan”. Mestre na criação de ambientes literários, a cadeia Eslite acredita que “quanto mais digitalizado e fragmentado o mundo se torna, mais as pessoas valorizam o calor da interacção”. O sucesso “reside na criação de um ambiente amigável e acolhedor para os amantes dos livros”. Não são eles que criam o ambiente literário? Esta devia ser uma história inspiradora para Macau – não foi Macau, um dia, uma cidade pequena cheia de calor humano?


Actualmente, o custo de vida em Macau é cada vez mais elevado e assistimos a uma escassez de mão-de-obra, sendo ambas as questões muito prejudiciais ao desenvolvimento e sobrevivência das pequenas empresas culturais. Crescer uma planta no cimento, como dizem, é muito difícil, mas ainda assim vale a pena tentar. A solução é integrar a literatura no dia-a-dia das pessoas e há, de facto, muito por onde começar. Por exemplo: organizar sessões de leitura em escolas e pequenas comunidades; criar na Internet, em livrarias ou em cafés acções de troca de livros em segunda mão sobre temas específicos, enquanto o comércio local e as associações políticas encorajam os seus membros a organizar grupos de leitura.


Em Macau, a leitura não deve ser tomada como uma actividade que se faz no aconchego do quarto. É necessário levar a literatura às pessoas. Só assim será possível construir um “ambiente literário” presente no nosso dia-a-dia.