Ashley Chong

Contabilista de profissão, Ashley faz parte de diversas associações de anime e banda desenhada em Macau. Foi ela que criou, ilustrou e desenhou a tira de banda desenhada do jornal Diário de Macau, no começo da década de 1990. Mais tarde, tornou-se autora de comics e presentemente é editora da MIND², uma revista de banda desenha publicada pela Comics Kingdom. Ashley participa também na organização da Exposição de Animação, Comics e Brinquedos de Macau, um evento organizado pela Macau Animação e Quadrinhos Aliança.

BD Digital vs BD em Papel

17a edição | 10 2016

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Certa vez um banco em Macau usou uma personagem relativamente conhecida de um livro de banda desenhada (BD) de Taiwan para promover os seus cartões de crédito. Graças a algumas redes sociais, esta personagem tornou-se finalmente conhecida e foi aceite pelas pessoas de Macau.


A internet é um mundo sem fronteiras e em teoria qualquer BD escrita em Macau pode circular a alta velocidade. Parece que a ideia de que “o mercado em Macau é tão pequeno” já não pode ser desculpa para limitar o crescimento da indústria de banda desenhada. Nos últimos anos, vários grupos de BD criaram plataformas online e têm publicado activamente os seus trabalhos ali. Artistas independentes de BD também publicam o seu trabalho nestas plataformas de modo irregular. Não só podemos encontrar manga yonkoma (manga de quatro vinhetas), mas também histórias. Claro que a qualidade destes trabalhos é outra questão. Quando comparado com os milhares de patacas que é preciso para levar trabalhos a imprimir (caso se concorra a subsídios do governo na qualidade de uma associação, é também preciso lidar com montes de trabalho administrativo) e para que sejam distribuídos, publicar esses trabalhos online é menos problemático. Os artistas precisam somente de estar focados em criar os seus trabalhos e, assim que estejam terminados, simplesmente necessitam de publicá-los na internet. Em poucos minutos terão ‘gosto’ e o trabalho pode tornar-se viral. Seja como for, os artistas de Macau não farão dinheiro com isso. É mais importante, especialmente para os novatos, que os seus trabalhos sejam vistos. A satisfação de receber feedback dos leitores é sem dúvida uma das razões que faz com que continuem a criar.


Ler banda desenhada online é uma actividade regular entre fãs do género. Mas normalmente apenas lêem artistas de BD famosos ou excelentes álbuns de BD. Quanto a artistas e trabalhos desconhecidos, os aficionados estão dispostos a dar uma olhada caso se cruzem com as suas criações online, mas muito rapidamente se esquecerão delas, a não ser que o leitor já conheça pessoalmente o artista ou que o leitor trabalhe nas indústrias criativas e esteja deliberadamente a recolher informações sobre BD local. Obras de BD que podem causar um impacto forte nos leitores, ou atrair os leitores para que as descarreguem e passem a fazer parte da sua colecção, não são algo comum em Macau. A internet é uma faca de dois gumes. Tem um oceano de informação que está disponível a todos. Mas as pessoas não valorizam realmente a informação. E a maior parte das pessoas ainda vêem a BD apenas como uma forma de entretenimento. A não ser que os álbuns de BD sejam excelentes e apresentem algo que estimule discussão, a atenção que lhes é dedicada é apenas fugaz e rapidamente serão esquecidos.


Voltando à personagem de BD de que falámos no começo deste artigo, tornou-se muito conhecida não apenas pela circulação rápida da informação na internet, mas acima de tudo devido à personagem em si mesma. Ela não é bonita de acordo com os padrões estéticos modernos. Mas, ainda que seja ficcional, o seu temperamento é tão real que ela parece uma projecção psicológica de cada um de nós, especialmente das mulheres. Esta foi a chave para o sucesso comercial da personagem. Também há algumas BDs online escritas por artistas de Macau. As suas personagens e cenas são muito terra-a-terra. As histórias são comuns mas ainda assim reconfortantes. Estes artistas podem não conseguir atingir a fama de um dia para o outro, mas alcançam um crescimento regular de leitores e as personagens acabam por tornar-se uma companhia para o leitor. Estas BDs começaram a receber atenção de pessoas de fora do sector, e podemos esperar para ver como vão correr as coisas no futuro. Claro que Macau tem os seus próprios problemas e o facto de uma BD receber ou não atenção do sector empresarial, não é o único critério para julgar se essa BD terá ou não sucesso.


Por outro lado, alguns artistas locais preferem imprimir as suas BDs. As encomendas e vendas são relativamente boas. No entanto, também é verdade que hoje um livro já não é apenas um livro, tal como a Livraria Eslite não é realmente uma livraria. Alguns leitores também compreendem que ler BD num smartphone é diferente de ler um álbum de BD. Estes dois hábitos de leitura não são substituíveis. Para os trabalhos de BD publicados apenas online, a qualidade do desenho e a estrutura da história talvez tenham de ficar comprometidas de modo a ser possível apresentar o enredo de forma precisa e captar a atenção do leitor. Este tipo de BD descartável não serve para os artistas aperfeiçoarem as suas técnicas de desenho. São como canções cantadas no karaoke. Uma vez que a leitura online é tão popular hoje em dia, os livros impressos são obrigados a reposicionar-se como uma “especialidade” e a oferecer mais valor acrescentado e o tipo de substância que os e-books não podem oferecer, de modo a atraírem mais leitores. Um bom design, juntamente com ideias criativas no que toca ao conteúdo, tornarão um álbum de BD “mais forte”. Os artistas e os editores estão por isso mais motivados a participar, já que vêem este processo como algo “divertido”. Além disso, os livros são mais fáceis de guardar e de passar às gerações seguintes. Isto explica que, mesmo com a informação online a inundar o mundo, os álbuns de BD impressos ainda desempenhem um papel activo.