Joe Lei

Compositor e letrista em Hong Kong e Macau. Escreveu mais de 300 canções. É Capricórnio e gosta de chamar as coisas pelos nomes.

O que aprendemos com o declínio da cena musical de Hong Kong? (2)

2a edição | 02 2015

Continuemos a discutir as razões da decadência da cena musical de Hong Kong.


Falta de formação, fracos padrões


Houve um tempo em que os ídolos e as bandas de música pop eram extremamente populares em Hong Kong, mesmo que tivessem limitações vocais. Bastava ter um rosto atraente e presença no palco para que os seus discos desaparecessem das prateleiras das lojas de música. Era-lhes até perdoado se cantassem fora de tom, desde que fossem bonitos. Mas à medida que foram envelhecendo, até os fãs mais fiéis lhes voltaram as costas. Não culpo estes ídolos, entenda-se. Entre as participações no cinema, publicidade, espectáculos, estreias e, claro, gravações de álbuns, não lhes sobrava tempo para dormir quanto mais para melhorar as suas técnicas musicais.


Até que um dia a popularidade passa, deixam de ter qualquer valor para as editoras e são postos de lado. A maioria das editoras não tem um plano-carreira para as suas estrelas e certamente também não se preocupa muito com o rumo futuro do panorama musical. O que verdadeiramente lhes interessa são os hits do momento e, por causa disso, os cantores de Hong Kong têm cada vez menos qualidade. Quando o público assiste a uma péssima performance pela décima vez, abandona o artista de uma vez por todas.


O papel da comunicação social


O papel dos meios de comunicação tem sido várias vezes descurado em muitos artigos que analisam as razões do declínio do panorama musical de Hong Kong. De facto, a relação entre a imprensa e a indústria musical antes da década de 1990 era de respeito mútuo, com muitos jornalistas e estrelas a dizerem-se amigos. Mas o aparecimento da Next Magazine, em 1990, veio mudar isto. Quando a imprensa começou a expor a vida privada dos artistas, a indústria de entretenimento sofreu um grande golpe. Quanto maior era a sua popularidade, maior a probabilidade de estes artistas se tornarem alvos, até de a sua carreira de sucesso ser destruída. Todas as notícias sobre o mundo do espectáculo se vulgarizaram; a qualidade do cantor ou a falta dela não era notícia, os jornais e as revistas estavam apenas preocupados com os rumores sobre as possíveis namoradas estarem ou não presentes nos espectáculos. Claro que as estrelas vivem da publicidade mas, a partir do momento que se tornam motivo de escárnio, não há beleza nem qualidades musicais que as salvem. Em resultado disto, depois de 2000 deixaram de surgir grandes estrelas. As de maior sucesso, como Pakho Chau e Shawn Yu, não chegaram aos calcanhares dos Four Gods of Cantopop, da década anterior.


Duvido que hoje em dia, e com o panorama mediático existente, artistas com o talento comparável a Andy Lau ou Leon Lai consigam alcançar o sucesso que estes últimos tiveram.


Assistimos, porém, a mudanças nos últimos dois anos. Os meios de comunicação começaram a mostrar menos interesse na vida privada dos cantores por três razões: primeiro, porque este tipo de notícia deixou de atrair os jovens leitores; segundo, a preocupação política dos cidadãos nos últimos anos ultrapassou em muito as celebridades e mexericos, e os leitores estão mais interessados no comportamento dos deputados do que no das estrelas; terceiro, quando as pessoas, aos poucos, começaram a não saber os nomes dos cantores, por que haveriam de estar interessadas na sua vida privada? Hoje em dia, os cantores de Hong Kong são tão desvalorizados que nem sequer têm lugar numa revista de coscuvilhices.


(Continua)