Lam Sio Man

Nascida em Macau, atualmente a viver em Nova Iorque. Dedica-se a exposições independentes, à escrita e ao trabalho em educação artística. Em 2019, foi curadora da Exposição Internacional La Biennale Di Veneza, inserida nos Eventos Colaterais de Macau, China. Trabalhou no Departamento de Assuntos Culturais da cidade de Nova Iorque, no Museu dos Chineses na América e no Instituto Cultural do Governo da RAEM. É licenciada pela Universidade de Pequim em Língua Chinesa e Artes, e mestre em Administração de Artes pela Universidade de Nova Iorque.

Nova Iorque: Um primeiríssimo plano cultural

22a edição | 08 2017

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Seminário de planeamento cultural da CreativeNYC.  Foto cedida por Tom Finkelpearl


Tendo vivido por um ano numa cidade vibrante e cultural como Nova Iorque, descobri, para minha surpresa, que o plano cultural da cidade não foi concebido até ao ano passado. Isso faz-me ponderar sobre se uma cidade criativa pode ser planeada. Um plano cultural trará benefícios ou danos para o desenvolvimento criativo da cidade?


Em Setembro do ano passado, o governo da cidade de Nova Iorque anunciou que, até Junho deste ano, o Departamento de Assuntos Culturais deveria submeter à aprovação do Conselho da Cidade um plano a dez anos. Como resultado, o departamento iniciou imediatamente a sua pesquisa e planeamento, arrancando com uma ronda de actividades e consultas públicas e criando o site “Creative New York” (CreativeNYC) para o projecto. Em colaboração com instituições culturais e grupos comunitários, o departamento organizou mais de 400 iniciativas diferentes para a comunidade, nas quais participaram 180 mil pessoas. Os números revelam a ênfase do governo no envolvimento dos indivíduos no planeamento e execução das políticas públicas.


Com base nessas actividades e no seu alcance, os resultados da pesquisa foram anunciados em Maio. A informação recolhida reflecte as preocupações culturais do público e ajuda a sustentar os planos culturais do governo. No entanto, é inevitável que os actores culturais da cidade tenham as suas queixas, com alguns a considerarem que a consulta pública foi realizada com demasiada pressa, comprometendo a oportunidade de as organizações culturais de menor escala assumirem um maior papel. Outra grande preocupação manifestada por estes profissionais é que um número considerável de actores culturais desconhecia os planos do governo e os exercícios de consulta. Como tal, impõe-se a questão: será isto revelador de que alguns actores culturais não estão atentos à agenda política numa área relevante para si ou terá o exercício de consulta sido inadequado?


Na minha opinião, não é expectável que um exercício de consulta política alcance 100% da população, particularmente devido às restrições de tempo. É preciso ter em mente que este é o primeiro plano cultural da cidade de Nova Iorque e que o período de consulta ficou limitado a oito meses. Como cada eleito para um cargo público apenas estará alguns anos em funções, resta-nos esperar que os funcionários em exercício e competentes tenham feito o possível para levar a consulta pública a bom porto. No caso particular de Nova Iorque, uma prioridade por detrás da elaboração da agenda política, do projecto de consulta pública e da posterior recolha de dados é promover a igualdade no desenvolvimento cultural. Perante a política anti-imigração de Trump e o seu desejo de terminar com o financiamento ao poder local, esta iniciativa revela a visão e a atitude abertas da cidade de Nova Iorque.


Para Nova Iorque, a igualdade cultural significa que diferentes grupos da comunidade podem usufruir dos mesmos direitos de participação nas actividades culturais e reivindicar as suas tradições. Afinal, a cidade é uma sociedade diversificada, cuja população é 60% não-caucasiana. Durante muito tempo, as acções culturais dessas pessoas não eram aceites como parte da tradição cultural da cidade, pelo que não obtinham financiamento do governo. A falta de recursos tornava difícil, para essas organizações comunitárias, melhorar o seu âmbito e a qualidade do seu trabalho, o que, num ciclo vicioso, dificultava a obtenção de mais recursos. O novo plano cultural visa reafectar os recursos da cidade e redefinir a cultura de forma mais abrangente.


Uma figura-chave na reengenharia desta mudança na política cultural nova-iorquina é o comissário de Assuntos Culturais, Tom Finkelpearl, que trabalhou anteriormente como curador do Queens Museum. Nessa função, ele decidiu instalar uma mesa de pingue-pongue no museu. Uma vez que há muitos residentes asiáticos no bairro, Finkelpearl estabeleceu um relacionamento pessoal jogando ténis de mesa com eles. Através do jogo, ele apresentou com sucesso essas pessoas ao museu e, como resultado, este tornou-se um óptimo exemplo de envolvimento com a comunidade. Hoje, no seu novo cargo, Finkelpearl convida a comunidade a expressar a sua opinião sobre o desenvolvimento cultural da cidade através de sessões de consulta semanais. Também procura conhecer os pontos de vista da população através de centenas de actividades e inquéritos. Ao mesmo tempo, prossegue com a sua política de “ténis de mesa” na supervisão da cultura. Talvez para ele o desenvolvimento cultural seja como este jogo: são precisos dois para o jogar. E Finkelpearl está disposto a ser o jogador que o inicia.