Ron Lam

Escritora a residir no Japão, especializada em design, lifestyle e jornalismo de viagem, Ron trabalhou anteriormente como editora das revistas MING Magazine, ELLE Decoration e CREAM.


Casa antiga com nova aparência

26a edição | 04 2018

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Quando passeava por Quioto, vi muitos locais de obras onde vários veículos de construção escavam com os seus braços mecânicos. 

Lembro-me de que existiu uma casa antiga neste lote, mas é incerto para mim o que vai ser construído ali após obra concluída. Em Quioto, há cada vez mais casas antigas a serem demolidas e substituídas por casas de um andar com estilo moderno que se encontram em todo o Japão, o que é muito penoso. O custo de manter casas antigas é mais elevado do que o de demolição e o de reconstrução. Os herdeiros das casas antigas não querem gastar muito, quer tempo quer dinheiro, para as manter e conservar, mesmo que não queiram demolí-las, o que não é difícil de entender. Por causa disso, quando me deparo com um edifício bem conservado, sinto-me particularmente feliz. 


Na verdade, há muitos casas antigas em Quioto que já foram convertidas em novos estabelecimentos, tais como o Centro de Arte de Quioto, anteriormente conhecido como a Escola Primária de Meirin, a Escola Primária de Tatsuike convertida no Museu Internacional de Manga de Quioto e muitas casas de madeira tradicionais (Machiya) convertidas em diversos hotéis. Uma agência imobiliária estabelecida em Quioto, Hachise, que se especializa em venda de Machiya, possui o seu próprio departamento de design dedicado à reconstrução e transformação de Machiya em casas modernas procuradas pelas pessoas. Embora alguns edifícios pudessem perder o seu charme original no processo de reparo, felizmente a aparência deles foi preservada. As Escola Primária de Meirin e Escola Primária de Tatsuike, consideradas como edifícios ocidentais, mostram uma fusão entre a cultura ocidental e a cultura japonesa. Por outro lado, Machiya apresentam detalhadamente as características da arquitectura tradicional do Japão. Recentemente visitamos o RC Hotel em Quioto, através do qual podemos descobrir uma vertente de Quioto, que tem recebido menos atenção, sendo um lado bizarro e cheio de subcultura, no qual são aceites quaisquer pessoas e diferentes modos de vida. 


O RC Hotel localiza-se na área de protecção paisagísticado Templo Kiyomizu-dera, onde os novos edifícios estão proibidos de ultrapassar dois andares. Todavia o edifício original do hotel foi construído antes da entrada em vigor do regulamento. Este edifício esbelto de 4 andares destaca-se entre casas antigas. No entanto, a aparência dele não é bonita, mas sim dilapidada e antiga, mostrando a cultura indígena de Quioto. Tendo mais de 50 anos, este edifício antigo de betão era antigamente um prédio residencial, estava quase totalmente abandonado devido à falta de manutenção adequada. Depois de assumir o controle do edifício, o fundador do hotel, Minakuchi, considerou muito interessante o contraste existente entre este edifício e o ambiente circundante, que podia representar a atmosfera cultural de Quioto incluindo uma integração entre o antigo e o novo e uma coexistência entre tradição e liberdade. Por isso, ele decidiu manter as características do edifício e teve como tema “Contraste” para que os visitantes pudessem ver outro lado interessante de Quioto. 


O lobby do hotel é esplendoroso. O corredor deserto, o portão de metal descascado, a cerca e o corrimão enferrujados foram totalmente preservados. Ao entrar no quarto, a atmosfera muda de repente. A sala pequena é limpa e confortável. A casa de banho é decorada com azulejos lindos, usando porta de correr de Machiya. A cama grande é encomendada e simples, com design estrangeiro. As decorações originais das paredes foram demolidas, expondo-se as velhas paredes de betão. Os furos nas paredes deixados pelos parafusos também não foram preenchidos. Tudo isto possibilita que as pessoas saibam as histórias da arquitectura. Mesmo a marca do hotel ainda tem a sua história, não sendo especialmente planeada, mas sim retirada do graffiti deixado no portão. 


Os quartos de cada andar do RC Hotel têm temas diferentes. O terceiro andar tem como tema a arte e utiliza os quartos como espaços de exposição onde são exibidas as obras dos artistas. O quarto que eu visitei mostra as pinturas do artista Ly. O hotel planeia, a partir deste ano, organizar vários tipos de actividades culturais e artísticas, seminários e workshops, etc. Parece que um novo ponto cultural de Quioto está a nascer. 


Outra coisa que me fez apaixonar por este hotel foi que os recepcionistas que me receberam eram de Taiwan e Macau. Ambos eram um pouco tímidos e não tinham o sorriso professional e o estilo típico de falar. É um modelo de gestão humanizada, não como o geral e inflexível, na minha opinião, é “muito Quioto”. Eles tornaram a nossa experiência de lá viver mais relaxada, mais confortável e sentimo-nos à vontade. 


A cultura de Quioto tem muitos aspectos que são revelados nos vários tipos de edifícios. Se um dia, por causa do benefício económico e do desenvolvimento da cidade, todos os edifícios antigos forem demolidos e substituídos por casas semelhantes sem personalidade, Quioto não será mais a mesma cidade a que todos aspiram.