SiSi Chang

Escritora freelancer. Mestre em Artes pela Universidade Nacional de Arte de Taipé, Instituto Superior de Estudos Teatrais. Chang olha para a viagem como uma disciplina e, cada vez que se encontra num sítio desconhecido, aprende a olhar para as coisas de uma perspectiva diferente. Amazing Australia, An In-Depth Guide to Angkor e Lonely Planet IN Series: Taiwan são alguns dos trabalhos publicados pela autora.

De edifícios abandonados a um bairro cultural moderno: a questão do renascimento de Dongguan

11a edição | 11 2015

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De uma certa perspectiva, a ideia de um bairro de artes culturais parece a solução perfeita para o relançamento de Dongguan, uma cidade envelhecida da província de Guangdong. Trata-se de uma cidade histórica, que sofreu os seus próprios contratempos. Tomemos Foshan como exemplo, onde o bairro mais antigo foi abandonado – a área cultural Lingnan Tiandi, com um extenso património cultural. Nem os residentes nem o governo tinham possibilidade de comportar os elevados custos de preservação. Como resultado, áreas nobres do centro da cidade deterioraram-se com o passar do tempo. Vários factores explicam este fenómeno. Em primeiro lugar, para levar a cabo a renovação de uma antiga cidade é necessário o realojamento dos moradores. Determinados edifícios históricos, protegidos ao abrigo de legislação nacional, devem ser preservados através de métodos tradicionais. Por isso, o desenvolvimento é limitado pela dificuldade na obtenção de materiais de construção adequados, como azulejos especiais, moldes, decorações em cerâmica, peças em madeira, entre outros. Todos estes materiais requerem o trabalho de artesãos qualificados. Além disso, após o restauro destas estruturas, levantam-se questões: poderão os antigos residentes voltar a viver no local? Caso possam, terão eles capacidade para sustentar a manutenção destes edifícios? Por outro lado, o que vai acontecer se os residentes preferirem novas habitações equipadas com serviços modernos? Se a maior parte dos residentes decidir partir, o que é que vai acontecer às estruturas arquitectónicas restauradas?


Lingnan Tiandi é um exemplo surpreendente. O que é que impulsionou tal inovação, e o que é que está por trás da escolha de entregar o projecto a um promotor imobiliário em vez de a um museu? A Shui On Land, que assumiu o projecto de reordenamento, apresentou um plano geral de desenvolvimento para o bairro, revelando não só a intenção de construir edifícios, mas também de criar uma nova cidade.


Que recursos ambientais são necessários para uma nova cidade? Quais são as vantagens e a rentabilidade de uma cidade cultural e histórica? Na realidade, uma reflexão aprofundada sobre o tema não é tarefa fácil. Considerando factores como as áreas de comércio, redes de transporte e a sinergia com as áreas vizinhas, Lingnan Tiandi é um exemplo de reordenamento bem-sucedido. À volta deste bairro antigo encontram-se vários serviços, como uma estação de metro, paragens de transportes públicos, comércio, serviços de Bed & Breakfast de gama alta, um bairro residencial completamente novo, escolas, etc. Os antigos habitantes dos edifícios restaurados são então realojados em novas residências, enquanto as habitações abandonadas poderão ser objecto de um restauro completo ou de um programa de reordenamento. Esse reordenamento preserva um bairro com base nas suas próprias características e valor histórico, tornando-o numa área com museus, lojas, restaurantes, empresas individuais e lojas de venda de lembranças. Com a abertura de lojas modernas e elegantes, a área tornou-se num centro dinâmico com oportunidades de comércio e de negócio.


Tendo passado por um longo período de declínio após o fim das actividades relacionadas com a prostituição, Dongguan foi abandonada por muito tempo pelos seus antigos residentes – um forte contraste quando se compara com o seu período de prosperidade, há três décadas. Muitas fábricas geridas por estrangeiros foram abandonadas. Nos últimos tempos, o espaço da fábrica da Vanke Properties foi convertido no Vanke Cultural Arts Space, e abriu as portas em Julho deste ano. Ao visitar o local pela primeira vez, em Agosto, percebi que muitos dos espaços ainda não estão mobilados e a área permanece muito semelhante ao que era quando a fábrica estava em funcionamento. Dentro deste espaço, adequados edifícios administrativos foram transformados em escritórios de design, agências de publicidade e empresas ligadas às artes. Espaços próprios para apoiar a venda a retalho foram transformados em bares, cafés e restaurantes sofisticados. Além disso, o espaço exterior, amplo e típico das fábricas, é agora utilizado para a organização de festivais artísticos, que atraem um fluxo considerável de pessoas, e como área para parques de estacionamento.


Isto pode ser visto como um passo importante para relançar as empresas em Dongguan. Afinal de contas, as artes e a cultura podem levar ao aumento da população residencial, estimulando, deste modo, o consumo privado e outras actividades. Estas actividades vão então levar ao aumento dos preços dos imóveis nos bairros e causar mudanças demográficas na região. Em Taiwan, mudanças semelhantes nas cidades são conhecidas como “acupunctura”, referindo-se ao alívio de bloqueios do corpo.


No entanto, nesta situação de benefício mútuo, os mais desfavorecidos poderão sofrer. Com o aumento dos preços do imobiliário e dos níveis de despesas, os mais pobres são ignorados e forçados a viver na periferia desta cidade dinâmica, e o fosso entre ricos e pobres vai aumentando com o tempo. Não sei como é que a China pode enfrentar este desfecho inevitável, mas a imagem de tantos mendigos reunidos à volta da estação ferroviária de Dongguan parece sugerir que a situação continua por resolver.