Ron Lam

Escritora a residir no Japão, especializada em design, lifestyle e jornalismo de viagem, Ron trabalhou anteriormente como editora das revistas MING Magazine, ELLE Decoration e CREAM.


Pequena editora e pequena livraria

29a edição | 10 2018

Recentemente deparei-me com uma colecção de poema de que gosto realmente. Chama-se O Som das Janelas. A colecção é um livro bastante fino, com apenas nove poemas. Os poemas são escritos por diferentes poetas japoneses, tais como Tamiki Hara e Toson Shimazaki, etc. Não estou particularmente familiarizada com a poesia japanesa e li apenas alguns poemas de Santoka Taneda e Shuntaro Tanikawa. Nunca li nada dos nove poetas presentes no livro. Mas isto não me impediu de desfrutar da colecção de poemas. Gosto desta colecção, já que os diferentes poemas constituem uma experiência unificada.

 

A capa do livro está embrulhada em papel glassine, como que coberta por uma cortina transparente. Quando se abre a capa, ela sussurra como a brisa soprando através das folhas das árvores. Depois começa-se a ler os poemas. Conforme avançamos por cada página, sentimo-nos como se estivéssemos a abrir uma janela a cada vez. Por trás da janela estão os cenários de tirar o fôlego dos poemas. A encadernação do livro também corresponde ao tema da janela e dos poemas. Podemos desde logo sentir a vibração que os poemas tentam transmitir quando seguramos o livro nas mãos.

 

O Som das Janelas foi publicado pela Hioriyomi, uma pequena editora com apenas uma funcionária chamada Nobuko Yamamoto. Nobuko Yamamoto é a dona, editora e designer da editora. Ela é até responsável por encadernar os livros. A Hioriyomi tem vindo a publicar colecções de poemas. Enquanto editora veterana, Nobuko Yamamoto decide o tema de cada livro e escolhe poemas adequados a partir de uma grande base literária. Ela tenta construir os cenários e vibrações que os poemas querem transmitir através do design dos livros e do estilo de encadernação. Na maior parte das vezes ela utiliza a técnica de tipografia. A combinação da tipografia e a impressão são entregues a empresas profissionais. Depois das páginas estarem prontas, Nobuko Yamamoto trata pessoalmente de encaderná-las em forma de livro. Isto requer uma paciência excepcional.

 

Para produzir O Som das Janelas, Nobuko Yamamoto convidou Masayo Mori, um especialista da indústria especializado em impressão de chapas de cobre, para fazer uma ilustração em chapa de cobre para cada poema. A última ilustração do livro é para o poema O Quarto à Tarde, de Kamenosuke Ogata. A ilustração foi impressa com a técnica de impressão de chapas de cobre e depois colocada na página do livro. Eis uma tradução simples do poema:

 

Maçãs, laranjas e bananas e

Repousam no prato em cima da mesa

Na tarde

No quarto

Como se estivessem coladas dentro da janela de vidro

Uma pessoa no canto do quarto

Sozinha

 

Este poema simples lê-se como um quadro que mostra uma cena tranquila e solitária. Se a ilustração ocupasse a maior parte do espaço na página, poderia ser muito distractivo. É por isso que Nobuko e Masayo tentaram fazer as ilustrações o mais pequeno possível, deixando mais espaço na página para transmitir uma sensação de tranquilidade. O estatuto especial desta editora Hioriyomi, uma empresa feita apenas de uma pessoa, permite a Nobuko Yamamoto apreciar os poemas e mergulhar na vibração que os poemas tentam criar. Talvez seja por isso que ela é capaz de produzir colecções de poemas tão delicadas e profundas.

 

Na verdade, editoras mantidas apenas por uma pessoa, como a Hioriyomi, não são raras no Japão. O especialista em encadernação de livros Akie Tsuzuki, por exemplo, tem uma empresa chamada Postaldia mantida apenas por si. Há também empresas como a Saicoro, de Hideyuki Saito, entre outras. O estúdio da Saicoro está até equipado com uma máquina tipográfica, permitindo que Hideyuki Saito possa cobrir todo o processo de produção do livro, do design, à impressão, encadernação, etc.

 

Estas editoras não publicam muitos livros. Nobuko Yamamoto, por exemplo, publicou apenas 100 cópias de O Som das Janelas. Hoje em dia estamos tão habituados a comprar online que faz com seja muito fácil que estas cópias circulem no mercado. No entanto, os consumidores que realmente gostam de livros com este tipo de design são provavelmente aqueles que lêem muito e adoram sentir os livros nas suas mãos. Estes leitores precisam de tocar o livro para saberem se se sentem tocados por ele ou não. Acredito que estes leitores não quererão julgar livros tão delicados como estes tendo por base fotografias online. A melhor plataforma para estes livros é a estante de uma livraria.

 

Vi os livros de Nobuko Yamamoto pela primeira vez na On Reading, uma livraria em Nagoya. On Reading é uma fusão de livraria com galeria. Apesar de ser pequeno, o espaço atraiu muitas editoras independentes para ali colocarem os seus livros e revistas. Depois voltei a encontrar os livros de Nobuko Yamamoto na Colon Book. A Colon Book é uma livraria fundada pelo designer Tetsuya Yuasa e pelo ilustrador Keiko Yuasa. A livraria está apenas aberta durante o período das exposições. Recentemente, ouvi dizer que o Shioribi, um café-livraria em Matsumoto, também tem à venda os livros de Yamamoto.

 

Estou a listar estes exemplos com um propósito: não é fácil para livros como estes, de editoras independentes, chegar às estantes de grandes livrarias, independentemente de quão bons e criativos são. Além disso, as grandes livrarias cobram uma comissão às editoras, o que não é aceitável para pequenas editoras. As livrarias pequenas funcionam de um modo mais flexível, o que dá às pequenas editoras a plataforma para colocar os seus livros no mercado e para que os leitores possam vê-los e tocá-los.

 

A verdade é que as plataformas de vendas são também o espaço em que podemos inovar. Quando cidades prósperas têm apenas grandes cadeias de vendas, isso talvez signifique que já faltam à cidade inovação e criatividade.