A ascensão dos museus privados: um “restaurante artístico” num armazém industrial

11 2015 | 11a edição
Texto/Flora Shaw

Se um museu for bem administrado, pode elevar a qualidade da cultura de uma cidade e tornar-se também num marco cultural. Além dos museus geridos pelo governo e pelas universidades, nos últimos anos têm aparecido em Hong Kong diversos museus com gestão privada, como é o caso de um novo museu de arte, que abriu as portas este ano. Poderá este museu, que se encontra isolado no edifício industrial Kwun Tong e promove a arte e cultura chinesas, trazer uma lufada de ar fresco a este “deserto cultural”?


Shaw: Flora Shaw, editora executiva da


Yeung: Yeung Chun Tong, director do Museu Sun


Suen: Chloe Suen, presidente da Fundação Simon Suen


Shaw: O Museu Sun é gerido pela Fundação Simon Suen. De todos os tipos de projectos que poderia apoiar, por que razão escolheu um museu?


Suen: Muitos empresários dedicam-se à caridade em Hong Kong, mas muito poucos são activos nas artes. Por isso, decidimos fazê-lo e sensibilizar a população de Hong Kong para a cultura. A fundação foi estabelecida em 2012, mas antes disso já tínhamos desenvolvido cerca de uma década de trabalho na promoção das artes em Hong Kong e no interior da China, sobretudo no universo da investigação de clássicos chineses. Pensámos que o que estávamos a fazer era de grande valor, embora para a maioria das pessoas parecesse um pouco desconectado da realidade e, por isso, quisemos encontrar uma forma diferente de promover a cultura chinesa entre o público. Como o espaço já era nosso e, coincidentemente, o senhor Yeung estava a reformar-se nessa altura do museu de arte da Universidade de Hong Kong (HKU), decidimos juntarmo-nos e abrir um museu.


Shaw: O Sun é um museu pequeno, e não está localizado nas áreas culturais mais comuns de Hong Kong (Wanchai, Central, Tsim Sha Tsui). Como planeia atrair visitantes?


Yeung: Não temos a aspiração de gerir o museu como se estivesse ao nível de um “tesouro nacional”. Neste momento, os recursos e padrões são insuficientes, e não temos as nossas próprias colecções. Mas mesmo quando eu estava na HKU, as exposições eram sempre emprestadas. Desde que tivesse uma ideia em mente para uma exposição, pedia emprestada e fazia uso dos recursos existentes. Na realidade, o Museu Sun e o museu da HKU são semelhantes e podem ser comparados aos restaurantes de Hong Kong: as pessoas que aqui vêm não estão à espera de comer marisco caro, mas têm à disposição pastéis de ovo e chá com leite, e o menu está constantemente a ser alterado. A verdade é que muitos dos grandes museus internacionais não estão ao nível dos “tesouros nacionais”, mas são museus mais pequenos que se tornaram famosos porque são bem administrados. Por exemplo, o Museu de Arte Mori, em Tóquio, e o Museu Miho, em Shiga, são exemplos de museus que elevaram consideravelmente o prestígio do Japão no mundo museológico, tornando-se referências. Por isso, não podemos ser excessivamente modestos; qualquer museu de gestão privada pode aspirar a tornar-se numa referência internacionalmente conhecida.


Shaw: Na sua opinião, por que razão têm os museus japoneses tanto sucesso?


Yeung: Em primeiro lugar, os japoneses acreditam que a cultura e as artes são parte integrante da vida, portanto não precisam mesmo de estar a promover intencionalmente os museus. As pessoas vão visitá-los. Quando vão a exposições em museus, eles também são muito organizados, param para se demorar em obras nas quais tenham um interesse particular, sem que ninguém os empurre para avançarem. Se há algo que vale a pena admirar, então vale a pena gastar tempo a fazê-lo. Em termos de conservação cultural, o Japão é, sem dúvida, uma potência. Não tem apenas abundância de exposições, os seus museus são também extremamente bem desenhados; as portas dos museus são todas automáticas para que a população idosa não tenha a necessidade de empurrar portas, e porque as portas automáticas são silenciosas e não perturbam outros visitantes do museu.


Shaw: Estes dois museus japoneses cobram entrada, mas vocês não. Sentem pressões financeiras? Quanto custa gerir um museu?


Suen: Os custos do Museu Sun estão a cargo da Fundação Simon Suen. Tem um custo anual de cerca de oito milhões de dólares de Hong Kong, incluindo os custos da compra de exposições. Para o benfeitor, a principal pressão de funcionamento vem do impacto do museu, como por exemplo o número de visitantes. Operamos um sistema de reservas e os nossos objectivos são neste momento a promoção e a educação e, por isso, não cobramos. Desde que abrimos, mais de mil pessoas visitaram o espaço e estamos muito satisfeitos com isso.


Yeung: O desempenho é um tópico amplamente discutido no universo dos estudos museológicos. O número de exposições e de visitantes é quantificável, mas serve apenas para referência. Por exemplo, não há muitos sistemas de transporte com acesso diário ao Museu Miho, o que significa que, mesmo sendo um museu muito conhecido, apenas umas centenas de pessoas o visita todos os dias. Em termos do número de visitantes, tem nota negativa. Mas ainda assim é muito conhecido e, por isso, precisamos de pensar noutras medidas de sucesso, como o seu valor educacional e a reputação. Se o museu conseguir canalizar os seus recursos limitados para apresentar com sucesso as melhores exposições, então é um museu de valor.


Shaw: O governo está a tentar desenvolver o bairro cultural de West Kowloon, mas vocês estão em Kowloon East. Como vê o futuro desta área?


Yeung: Na realidade, acredito que as condições são adequadas. O governo também tem um plano para revitalizar Kowloon East. Os armazéns industriais vizinhos estão a atrair artistas, designers e uma grande quantidade de pequenos restaurantes e lojas, que vão tornar-se parte da fábrica cultural de Kowloon East. A localização do Museu Sun em Kwun Tong complementa o desenvolvimento cultural e recreativo da área. Podemos promover a cultura de forma independente e ao mesmo tempo adaptarmo-nos ao plano de reordenamento de Kowloon East. Acredito que um dia Kwun Tong vai ter uma cara nova e tornar-se num brilhante bairro artístico.