Fresh Wave: a desenvolver novos talentos para o sector cinematográfico de Hong Kong

10 2015 | 10a edição
Texto/Flora Shaw

Wang Changtian, que investiu em vários grandes sucessos de bilheteira no interior da China, disse um dia que não existem mais de 60 realizadores no universo de língua chinesa com quem pudesse colaborar. A falta de bons realizadores de cinema não é um problema que se limita apenas ao interior da China, mas estende-se também a Hong Kong, uma cidade que já conheceu um considerável número de sucessos de bilheteira no mercado. Kong Chi Keung, produtor de cinema em Hong Kong, diz: “O que é que poderá ter levado à escassez de filmes? Na maioria das vezes, não se deve à falta de oportunidades para fazer filmes, mas ao facto de não termos realizadores capazes em número suficiente.”


O sector cinematográfico de Hong Kong desenvolveu há já uma década o concurso de curtas-metragens Fresh Wave [Fresh Wave Short Films Competition], com o objectivo de descobrir e preparar novos talentos. Com a participação de estudantes e a apresentação de categorias abertas, a competição passou de um simples concurso de vídeo à presente projecção de curtas-metragens de renome internacional. O sucesso deve-se ao facto de os critérios de premiação estarem focados no talento e nas ideias que capacitam os filmes, e não na experiência ou trajectória dos realizadores. Quem captar as melhores ideias pode vencer o prémio. São organizados seminários onde realizadores locais e internacionais partilham as suas experiências, enquanto alguns dos principais cineastas de Hong Kong, como Herman Yau Lai To, Chan Muk Sing e Mabel Cheung Yuen Ting, servem de mentores, oferecendo aos participantes conselhos muito úteis.


O Fundador do Fresh Wave, Johnnie To, observa: “O Fresh Wave tem como missão descobrir jovens realizadores, e reconhece a importância de cultivar esses talentos. Este concurso é o canal perfeito para apresentar o talento desses artistas emergentes”.


Na década passada, muitos participantes começaram as suas carreiras no cinema através deste concurso, acabando por chamar a atenção de produtoras de cinema e recebendo encomendas. Por exemplo, Chow Kwun Wai, que passou pelo Fresh Wave em 2011, conseguiu um contrato com a Edko Films e a Milkyway Image para a produção da sua primeira longa-metragem em 2013: A Complicated Story, uma adaptação do livro de Yi Shu, e que conta com a participação de Jacky Cheung e de outros actores consagrados. Esta é certamente a mais encorajadora das experiências para um jovem realizador. Além disso, a Milkyway Image também encomendou a três vencedores do Fresh Wave—Au Man Kit, Hui Hok Man e Vicky Wong—a co-realização da longa-metragem Trivisa, com os produtores Johnnie To e Yau Nai Hoi.


Pode não parecer muito rentável apoiar o desenvolvimento de apenas alguns jovens realizadores, dados os recursos consideráveis fixados em dez anos. No entanto, Johnnie To defende este esquema, realçando: “Fazer cinema é um negócio moroso e não tem atalhos. Por exemplo, bons realizadores como Dante Lam Chiu Yin, Zheng Baorui e Alan Mak Siu Fai, cujos trabalhos rendem centenas de milhões, têm trabalhado arduamente desde os anos 1980. Eles alcançaram reconhecimento apenas muito recentemente com as suas respectivas obras-primas mais maduras. Eu, por exemplo, não fiz um bom filme nos primeiros sete anos desde a minha estreia. É necessário muito tempo para desenvolver um filme. Um realizador de cinema não o pode fazer apenas com talento. Ele ou ela tem de ser apaixonado pelo ofício e ter um forte sentido de visão”.


Face à forte tendência das parcerias cinematográficas, qual será o futuro do panorama do cinema de Hong Kong? Será que o Fresh Wave conseguirá preparar jovens realizadores que sejam capazes de produzir filmes artísticos e também comerciais?


To diz: “Na indústria do cinema, o investimento nos filmes artísticos é muito raro. Por outro lado, os recursos para os filmes comerciais são significativos. De facto, existem muitos filmes comerciais com mérito artístico. Não sou contra projectos de parcerias porque, afinal de contas, o mercado e o investimento no interior da China são muito maiores e oferecem mais oportunidades aos cineastas. Temos de perceber que o cinema de Hong Kong já não domina o panorama devido à falta de orçamento. No passado, podíamos fazer um filme com um orçamento de dois ou três milhões. Hoje em dia, é difícil conseguir fazê-lo sem um orçamento de dez milhões. Não há investidores dispostos a ceder um orçamento superior ao valor previsto das receitas de bilheteira. Em Hong Kong, as receitas de bilheteira de três ou quatro milhões tornam difícil conseguir um orçamento para o filme que atinja os dez milhões. No entanto, se for em parceria com o continente, é possível receber um orçamento de 30 a 40 milhões. O importante é que o realizador encontre o melhor trajecto para a sua arte e tenha a coragem de assumir riscos na sua jornada criativa”.