Tanto o consumo e como o design aspiram à perfeição. Mas que quantidade de recursos acabamos por desperdiçar nesse processo de tentar criar um produto irrepreensível?
Lixo nos nossos quartos
Muitos designers fazem, de facto, uso do lixo. A ideia do upcycling surgiu em 1996 na Europa, quando se começou a perceber que a reciclagem não é suficiente para resolver o problema dos resíduos. No entanto, só foi posta em prática na última década. Nos EUA, por exemplo, vários designers começam por lançar os seus produtos na loja online Etsy. As vendas de artigos feitos com desperdício transformado cresceram de 7.900 artigos em 2010 para cerca de 30 mil em 2012, representando um crescimento de 275 por cento. A marca de alta-costura Hermès lançou a sua linha “petit h” há alguns anos, utilizando couro com imperfeições e peças metálicas de sobras para acessórios caros e artigos de decoração.
Os conceitos “upcycling”, “desenvolvimento sustentável” e “modo de vida com baixo teor de carbono” estão a ganhar grande influência nos mundos da moda e do design. Nasceram nos EUA e na Europa e, gradualmente, estão a ser adoptados na Ásia. Por exemplo, a indústria hoteleira é uma das que produzem maior quantidade de resíduos. O Centro de Design de Taiwan e a Companhia de Desenvolvimento de Energia Sustentável MINIWIZ trabalharam em conjunto com o Hotel W para transformar garrafas usadas de PVC, chinelos e artigos de higiene de plástico em peças sofisticados e práticas, como bases para copos e candeeiros, que voltam aos quartos do hotel, agora como peças de arte.
Bom para o corpo, a mente e o espírito
Ter consciência ambiental é já essencial para os jovens designers. Na região vizinha, Hong Kong, um grupo de designers lançou uma campanha que vai mais além e que faz bem à mente e ao espírito.
O design ao serviço da inovação social é o conceito subjacente à associação de design CoLAB, que há uns anos gravou “I’MPERFECT” em chávenas de porcelana com pequenas imperfeições. A ideia é comercializar produtos imperfeitos como artigos de design e lembrar ao consumidor que a imperfeição não está na chávena mas na forma como a vemos. Em colaboração com a Joint Publishing, também reembalou 25 livros já fora dos escaparates, dando assim uma nova vida a estes livros imperfeitos.
O fundador da CoLAB, Hung Lam, revela que upcycling é apenas uma parte do I’MPERFECT. “Quando o nosso trabalho começou a ser amplamente divulgado pela comunicação social, algumas empresas disponibilizaram-se para nos dar os seus resíduos, embora, na verdade, o objectivo fosse escaparem ao fardo do tratamento de resíduos. Foi quando percebemos que precisávamos não só de proteger o planeta mas também a nossa mente e espírito.”
No ano passado, a CoLAB iniciou um programa de residência artística no Oil Street Art Space, convidando vários artistas a reflectir sobre o que é qualidade de vida.
Por exemplo, muitas pessoas pensam que um espaço artístico precisa de ter um café onde se possa pensar e ler, mas Hung Lam refutou dizendo que o café não faz parte da nossa cultura gastronómica local e, na realidade, há demasiados cafés no mercado. Por isso, estabeleceu-se uma loja de chá de ervas em Oil Street. O chá de ervas é uma bebida apropriada a todas as idades, dos três aos 80 anos, e é saudável para o corpo.
Nos últimos anos, a CoLAB tem trabalhado com diferentes organizações na tentativa de aproximar as áreas comercial, cultural e social através do design. A ideia é não só criar um produto ou organizar uma actividade, mas também levantar importantes questões sociais. Por exemplo, a I’MPERFECT Food educa o consumidor a olhar para a comida com mau aspecto e ver apenas que se mantém em perfeitas condições para ser ingerida, com todos os valores nutritivos em ordem, e que a nossa antiga maneira de olhar para ela gera imenso desperdício; com a I’MPERFECT Tour, guias invisuais ajudam os participantes a sentir diferentes lugares de uma forma totalmente nova e “imperfeita”. Estes são apenas dois exemplos de como ser criativo e agir de modo a promover mudanças reais na sociedade, começando por olhar para estes objectos imperfeitos de uma outra perspectiva.
O mundo não é perfeito. O projecto I’MPERFECT recorda-nos que se, mudarmos um pouco a nossa maneira de ver e abraçarmos as imperfeições, a vida pode ser igualmente admirável e ter muito mais significado.