Eugenia Lo

Eugenia Lo é uma jornalista independente e editora. É mestre em Criminologia e investiga o sistema de segurança pública no Interior da China. Com fortes laços familiares em Macau, Lo pesquisa de forma continuada o desenvolvimento cultural e social da cidade. Ao longo dos anos, Lo trabalhou com uma série de corporações internacionais e institutos, incluindo a Universidade de Hong Kong, British Council, Commercial Press (H.K.), Joint Publishing (H.K.), entre outros, participando em vários projectos de edição, relações públicas e tradução.

Vista sobre os edifícios históricos

8a edição | 08 2015

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Fui há pouco tempo a Taipé com um amigo, que é investigador da história do Cristianismo. Por isso, alguns locais históricos ligados à religião cristã faziam parte do nosso itinerário, como é o caso da Universidade Aletheia em Tamsui. Quando chegámos ao edifício Bok Su Lao (A Casa dos Reverendos), um pequeno café virado para um lindíssimo jardim no piso inferior despertou a nossa atenção.


Visitar este estabelecimento não fazia parte dos nossos planos, mas o vício do café falou mais alto e não consegui resistir a pedir uma chávena. Sentámo-nos e ficámos a observar o dono deste espaço enquanto preparava o nosso café. Também passei algum tempo a apreciar o interior do estabelecimento. A máquina de café expresso com um design retro e feita de cobre, a mobília de madeira e os pequenos anjos em cerâmica à janela combinavam na perfeição com este edifício de estilo colonial de 1909, de alvenaria fina e pontiaguda, e com um alpendre de tijolos vermelhos. Com todos os produtos culturais e obras de arte no café, era bem possível passar aqui uma tarde e descansar caso não tivéssemos outros planos.


O edifício Bok Su Lao foi originalmente construído em 1909 para servir como residência do reverendo William Gauld. Depois de morrer, em 1923, a casa passou a albergar o reverendo Hugh MacMillan, que esteve à frente da Escola de Teologia de Taipé, sendo posteriormente o lar do reverendo James I. Dickson, ligado à escola secundária de Tamkang. Originalmente, este edifício vermelho não tinha qualquer relação com café, mas o proprietário do café Bok Su Lao, Kevin Lin, conta que foi o destino que o juntou ao café e a este edifício centenário. Como o governo de Taiwan apoia a preservação e a revitalização do património, Lin aproveitou esta boa oportunidade para converter um pequeno espaço do edifício num café. Foi o proprietário que desenvolveu, além disso, o design de interiores e de produto deste espaço. O produto principal é o café preparado na hora, claro, mas estão disponíveis também mais de 20 produtos artísticos especialmente desenhados para este estabelecimento, como obras de arte em forma de grãos de café, imagens do reverendo George Leslie Mackay, fundador da Universidade de Aletheia, e produtos relacionados com a religião cristã, além de fotografias e desenhos de Lin. Pessoalmente, tenho preferência pelas chávenas de café com o desenho do Bok Su Lao e as fitas decorativas onde estão estampados os edifícios da universidade.


Além deste aspecto criativo, Lin também quer mostrar aos seus clientes o seu espírito de serviço. “Podemos guardar os postais escritos pelos nossos clientes e enviá-los numa data determinada. Este atendimento especial permite que os clientes e os seus amigos distantes sintam o carinho do manuscrito e também o espírito de Mackay.” E já que se fala neste toque humano, Lin também organiza exposições de arte e arrenda o espaço a artistas locais para eventos especiais, tais como aulas de arte ou clubes de leitura. O seu trabalho conta com o apoio e estima dos clientes e artistas e, por isso, ele espera que no futuro seja possível aumentar a venda de produtos culturais.


Abrir uma loja num local turístico é uma oportunidade única mas tem vários obstáculos. O proprietário tem de cumprir escrupulosamente as regras e não pode alterar sem permissão o interior ou o exterior do edifício. A simplicidade do design de interiores do café Bok Su Lao foi uma boa solução. Lin fez uso dos seus próprios produtos criativos e obras de arte para transmitir um certo charme e mostrar aos clientes a sua paixão. Com o seu envolvimento no funcionamento do café, o responsável rapidamente entendeu quais eram as preferências dos clientes e aperfeiçoou de imediato o seu serviço.


Alguns edifícios históricos de Macau albergam lojas e restaurantes. O Governo da RAEM e do Instituto Cultural têm dado muito apoio aos projectos de revitalização. No entanto, apercebi-me que estas lojas ou têm muitos produtos ou têm poucos e, na maioria dos casos, falta-lhes uma ligação forte ao próprio edifício. A falta de personalidade remete de certa forma para o desperdício do potencial do edifício. É verdade que produtos semelhantes, tais como postais, podem ser encontrados e vendidos na maioria das cidades turísticas. No entanto, um bom proprietário de uma loja poderá juntar ao mesmo pedaço de papel algum calor humano. Claro que um plano de negócio bem estruturado é importante, mas a capacidade de observação também é fundamental para o sucesso. Gerir um negócio criativo não é a mesma coisa que gerir um supermercado. Os lojistas devem ter espírito de iniciativa e entender os padrões de consumo e a psicologia dos clientes.