Joe Lei

Compositor e letrista em Hong Kong e Macau. Escreveu mais de 300 canções. É Capricórnio e gosta de chamar as coisas pelos nomes.

O que aprendemos com o declínio da cena musical de Hong Kong? (1)

1a edição | 01 2015

Em 2009, numa curta viagem de negócios a Tóquio, um amigo japonês, na casa dos 40 anos, que sabia que eu era músico, trouxe-me alguns CDs de artistas de Hong Kong da década de 90, como Winnie Lau e Vivian Chow. Disse-me que era um admirador destas cantoras há mais de uma década e quis saber se eu as conhecia pessoalmente. Sorri e disse-lhe que não. No entanto, não consegui deixar de pensar nos anos 80 e 90, quando a cena pop de Hong Kong estava no seu auge, estendendo o seu alcance até à Coreia, Japão e ao Sudeste Asiático. Foi a Idade de Ouro do cinema e da música pop de Hong Kong, com inúmeros talentos e muita vitalidade. Depois, não sabemos quando, tudo mudou de repente – os cantores já não faziam sucesso, as suas canções já não eram populares, ninguém interpretava canções em cantonense em concursos. O mais decepcionante era que mesmo os jovens de Hong Kong não ouviam os seus cantores. Foi uma época desesperante.


Como explicar o declínio da cena musical de Hong Kong? James Wong, o famoso letrista romântico de Hong Kong, já falecido, explorou esta questão detalhadamente. Não vou aqui repetir tudo o que Wong escreveu. Em vez disso, como alguém que trabalhou na indústria da música pop de Hong Kong, gostaria de expor as contrariedades que eu, pessoalmente, vivi e observei. Espero que meus colegas de Macau possam retirar algo destas vivências. Não pretendo criticar ninguém em particular em Hong Kong, já que todas as pessoas envolvidas nesta indústria partilham a responsabilidade do seu declínio. A indústria musical de Macau está apenas a começar mas, sendo tão próxima de Hong Kong culturalmente, pode ter como referência os sucessos e os fracassos, os prós e os contras da cena musical na região vizinha, para estudar e reflectir, antes que seja tarde de mais.


Lucrar sacrificando a criatividade


As indústrias culturais e criativas de Hong Kong correm sempre atrás de lucros a curto prazo, especialmente quando algo tem imenso sucesso. Tomemos o cinema como exemplo: logo a seguir a “A Better Tomorrow” se tornar um grande sucesso, apareceram vários filmes de gangsters de temática semelhante, sempre fracas imitações, como “Tragic Hero” e “Rich and Famous”, entre outros. Quando “God of Gamblers” teve enormes receitas de bilheteira, foi de imediato seguido por uma série de filmes tais como “All for the Winner”, “God of Gamblers 2”, “The Top Bet” e “The Queen of Gamble II”. Continuaram a usar a mesma fórmula até esgotarem o tema e serem finalmente rejeitados pelo público.


A cena musical de Hong Kong enfrentou uma situação semelhante. Desde o final dos anos 90, muitas editoras foram dominadas por empresários, não por músicos. Todas as decisões se tornaram puramente comerciais. Se um determinado tipo de canção se revelava popular, a mesma fórmula era repetida à exaustão. Por exemplo, em 2007 compus “Electric Light Bulb” e a canção foi um grande sucesso. Dois produtores abordaram-me e pediram-me para escrever uma canção “semelhante”. Mas o que é uma canção “semelhante”? Será que eles queriam uma canção sobre uma chaleira eléctrica, um fogão eléctrico ou uma ventoinha eléctrica? Claro que não é fácil escrever uma canção de sucesso e é normal que as pessoas desejem repetir uma fórmula que resulta. Mas copiar uma canção que foi um êxito também não é fácil. A maioria das réplicas são superficiais, falta-lhes essência. Durante anos, todo o mercado de Hong Kong estava inundado com um único tipo de música: baladas ao estilo local, recheadas de longas letras, e todas pareciam soar ao mesmo.


Nunca achei que as baladas ao estilo de Hong Kong ou as músicas para Karaoke fossem um problema – muitas têm até melodias e letras sofisticadas. O problema é quando todo o mercado está saturado apenas com essas baladas de Karaoke. Em comparação com Hong Kong, os músicos de Macau são, realmente, abençoados por não terem de obedecer ao mercado, que é pequeno. Os músicos podem, livremente, compor canções e escrever as letras que desejam. Pessoalmente, quando escrevo canções para músicos de Macau, são mais variadas do que as que componho para Hong Kong, quer em termos de género como de estilo. Talvez estas canções feitas para Macau não sejam tão reconhecidas como as de Hong Kong, mas realmente acredito que a maneira correcta de fazer música não é calcular todos os modelos de negócio e compor uma canção de sucesso, mas tão simplesmente escrever uma boa canção. (Continua)