Un Sio San

Un obteve a dupla licenciatura em Língua Chinesa e Arte (produção de cinema e televisão) da Universidade de Pequim e o duplo mestrado em Estudos da Ásia Oriental e Estudos da Ásia-Pacífico da Universidade de Toronto nas áreas de investigação em literatura e cinema. Ganhou o prémio de Henry Luce Foundation Chinese Poetry & Translation e foi poeta residente no Estúdio Criativo de Vermont nos EUA. Foi convidada a marcar presença em vários festivais internacionais de poesia tal como o festival realizado em Portugal e trabalhou como letrista da primeira opera interior original de Macau “Um Sonho Perfumado”. Publicou algumas colecções de poemas nos dois lados do estreito e tem-se envolvido no meio académico e em publicação por muito tempo, além de escrever colunas para meios de comunicação em Taiwan, Hong Kong e Macau.


Rosa do Norte: um agregado de livrarias independentes e criatividade na Tailândia

39a edição | 06 2020

Eu costumava ter muitos poucas expectativas em relação a Chiang Mai, a chamada Rosa do Norte na Tailândia. Mas acabou por ser um lugar completamente espantoso.

Chiang Mai é uma cidade histórica no país. No entanto, também tem uma próspera dinâmica de mercados criativos e aldeias culturais e criativas. A cidade é vibrante e tem uma atmosfera hipster. Ao passear pela cidade, entrei acidentalmente numa livraria independente chamada Ranlao. Por acaso, dei de caras com a festa de 20 anos daquele dia.

A maior parte dos clientes da maioria das livrarias de Chiang Mai são turistas de outros países. Estas vendem principalmente livros em inglês. Em contraste, a Livraria Ranlao vende principalmente literatura tailandesa, livros ilustrados e mangá. A livraria tem também clássicos da literatura mundial em tailandês e produtos culturais e criativos e locais. O que mais me impressionou foi que, por mais discreta que pareça esta livraria, ela é na verdade um ponto de ligação de culturas diferentes. Numa parede do interior da livraria estão cartas escritas por autores tailandeses ao proprietário. À porta, cantores folk tocam gratuitamente. Subindo ao primeiro andar, descobrimos uma festa de música electrónica que também é gratuita. É possível conhecer profissionais locais, intelectuais, hispsters, estudantes universitários, residentes locais de chinelos, turistas e visitantes que estão de passagem. Dentro da loja existem mais de dez bancas culturais e criativas que vendem comida local, bebidas enzimáticas, produtos orgânicos frescos e artesanato cultural de Chiang Mai. Algumas das marcas já têm alguma reputação. Alguns ex-trabalhadores da indústria cultural e criativa que agora têm lojas físicas disseram-me que estavam ali simplesmente para celebrar a sua amizade com o proprietário da Livraria Ranlao, para lhe agradecer o apoio dado as suas marcas eram desconhecidas. Eles estão muito gratos ao dono da livraria por lhes dar a possibilidade de consignar e promover os seus produtos na Ranlao ao mesmo tempo que oferece uma plataforma de intercâmbio inspiradora.

Há três aspectos a observar para examinar se uma livraria independente é bem-sucedida ou não: a facturação passada, a selecção de livros e as preferências de curadoria, e uma ampla rede que conecte comunidades, diferentes grupos sociais e pessoas que partilham interesses e valores diferentes. Uma livraria independente não está isolada do mundo. Para uma livraria independente, o foco está mais em agregar criatividade, ligando comunidades e artistas vizinhos por toda a cidade.


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Tivemos muitas discussões sobre espaços culturais e criativos, que falam principalmente sobre a agregação tangível e intangível da criatividade. Agregações tangíveis são principalmente grandes comunidades (como o Pier-2 Art Center em Kaohsiung, Taiwan), quarteirões de cidades (como o Wudaoying Hutong em Pequim), edifícios de escritórios ou fábricas (PMQ—Staunton e The Mills, em Hong Kong) e aldeias culturais e criativas (como a Baan Kang Wat de Chiang Mai). Agregações intangíveis podem ser comunidades online. Os influenciadores da Internet, semelhantes às empresas culturais e criativas, concentram-se em aumentar a lealdade dos fãs e aumentar o número de seguidores. Pergunto-me se existem outras alternativas para agregações tangíveis e intangíveis de criatividade.

Há muitas razões pelas quais é difícil desenvolver aldeias culturais e criativas em Hong Kong e Macau. Além de factores como as rendas, o fluxo de visitantes e a falta de diversidade, ter de operar em relativo isolamento também é uma grande falha. Os desafios trazidos pelo declínio da indústria editorial e o surgimento de livros digitais e livrarias online tornaram necessário que as livrarias físicas se diversificassem. As livrarias independentes também estão gradualmente a transformar-se em lojas agregadoras de criatividade, tangíveis e intangíveis. Bem ao lado da Cinemateca Broadway em Hong Kong, está a famosa livraria independente Kubrick que disponibiliza um café e clubes de leitura aos hipsters da cidade. Além disso, a Kubrick também tem um serviço de venda de alimentos orgânicos locais à consignação. Apoia igualmente o desenvolvimento de artistas locais de livros ilustrados através de acções como a oferta de serviço de design de capas de livros e a realização de exposições de livros ilustrados. A Pin-to Livros, uma popular livraria independente em Macau, é um importante canal de venda à consignação de produtos culturais e criativos (especialmente publicações, álbuns de música, merchandise de literatura como pins com temas literários) de regiões vizinhas, enquanto serve de plataforma para o intercâmbio cultural (seminários, entrevistas e mini-concertos).

“O sucesso de uma política de indústria cultural reside em criar um ambiente cheio de criatividade”, disse numa entrevista Sirion Hrimpranee, director do Departamento de Pesquisa Política do Centro Nacional de Conhecimento da Tailândia. O público das artes tornou-se uma ferramenta moderna que ajuda a transformar espaços numa sociedade pós-industrial global. Governos de todo o mundo têm promovido políticas como a integração da arte em espaços públicos e a inserção da arte nas comunidades, na esperança de que os cidadãos se envolvam activamente na criação cultural, em vez de serem meros destinatários. Mas a maioria dos esforços está apenas a tornar a arte mais disponível, como acontece ao fazer apresentações artísticas ou montar instalações artísticas. Há falta de esforços consistentes e aprofundados. Somente quando combinamos comunidades de artistas com comunidades residenciais é que podemos construir um ecossistema substancial. Como as principais áreas culturais e criativas concentradas trabalham duro para se desenvolver e as plataformas online continuam a surgir, o governo precisa considerar mais o poder agregador que as livrarias independentes têm ao elaborar políticas para as indústrias culturais e criativas.