Johnny Tam

Realizador teatral e director artístico do Grupo de Teatro Experimental de Pequena Cidade. Viveu e trabalhou em Xangai e Berlim. As obras recentes incluem O Sr.Shi e o Seu Amante Lungs.


A cidade cultural é também uma cidade “check-in”?

33a edição | 06 2019

Chongqing, um município no sudoeste da China, é frequentemente associado ao clima quente e a hot pot picante, bem como a “um comboio que atravessa um prédio de 19 andares” (Estação de Liziba). No entanto, esta cidade, que é atravessada por montanhas e paisagem urbana, está a integrar arte e cultura no seu rápido desenvolvimento dos últimos anos, a um ritmo único, atraindo um grupo de jovens criadores que amam arte, design, média e marcas a estabelecer-se ali.


Uma das coisas mais fascinantes sobre qualquer lugar do mundo que possa ser chamado de cidade de cultura é o seu conteúdo espiritual, como a rebelião de Berlim e a melancolia de Paris. No interior da China, Xangai e Pequim também estão a construir uma nova era de templos da arte por meio de vários programas de intercâmbio internacional e esforços para difundir as artes e culturas tradicionais do país. No entanto, quando se trata do conteúdo espiritual, como um sinal de espírito, os slogans de propaganda emitidos por essas duas cidades são “confiança mútua, benefício mútuo” e “patriotismo, inovação”. Essa visão parece ser tomada por garantida neste país que enfatiza o desenvolvimento económico. Portanto, estava ansioso por esta viagem a Chongqing, na qual poderia sentir pessoalmente as diferentes atmosferas culturais do sudoeste da China e ter uma nova perspectiva sobre a direcção do desenvolvimento das cidades no interior da China.


No primeiro dia, visitei o Eling Testbed 2 em Chongqing. Este grande espaço cultural e criativo foi oficialmente aberto ao público em meados de 2017, e foi antes uma fábrica de impressão de notas do banco central na Era Republicana da China. Agora, tornou-se num espaço abrangente integrando lojas culturais e criativas, espaços de exposição, restaurantes e uma rua de petiscos. Em toda parte, esta antiga fábrica faz as pessoas lembrarem os velhos tempos. Cada edifício tem cerca de quatro a cinco andares e cada andar é ocupado por diferentes marcas culturais. No andar de cima, há um café temático do filme I Belonged to You. Visitantes e entusiastas da fotografia ficam empolgados para tirar fotos e ir às compras nestes locais de “check-in”. Todo o projecto de reconstrução do Testbed 2 foi realizado em Chongqing pelo conhecido arquitecto britânico Prof. Will Alsop e a sua equipa. Eles criaram primeiro o Testbed 1 em Londres e, em seguida, aplicaram-no em Chongqing com base nas suas experiências bem-sucedidas naquela altura, por isso o projecto recebeu o nome de Testbed 2.


Este novo marco cultural de Chongqing não só exibe muitos produtos culturais e criativos interessantes, mas também desenvolve a “economia da atenção” de forma incisiva e vívida. Na rede de partilhas e gostos, conseguir a maior quantidade de cliques e de atenção significa tirar uma boa foto. O design espacial de todo o Testbed 2 está repleto do sabor da Era Republicana da China, como se estivéssemos a entrar num estúdio de filmagem. “Locais de check-in” não são necessariamente os que mostram o espectáculo do mundo e um grande objecto para fotografar, mas aqueles que apresentam cenas que contêm o sopro da vida de uma maneira “artística”. Quando o design do espaço ajuda a preparar tudo, só é precisa pegar na câmara e disparar.


No segundo dia da viagem, por recomendação de amigos, fui à livraria mais bonita, a Zhongshuge, que combina elementos da cultura Bayu e delineia de forma inovadora a “cidade natal” nos corações das pessoas de Chongqing. Nos últimos anos, o funcionamento das livrarias físicas tornou-se cada vez mais difícil. Até mesmo a livraria Jifeng, em Xangai, que defendia a liberdade de pensamento, encerrou em 2018. Isto significa que as livrarias físicas simplesmente não conseguem fazer dinheiro com as vendas de livros. Por isso, existem diferentes tipos de livrarias a explorar novos modelos de negócio. A livraria Zhongshuge é a mais notável entre elas. O design espacial com o conceito de “shan zhai” (tradução: cidade de montanha) tornou-se uma atracção, fazendo da livraria um marco cultural tão popular quanto uma atracção turística e atraindo com sucesso um grande número de visitantes. Com o rótulo de “lugar popular para celebridades da Internet”, a livraria também se caracteriza por ser uma combinação de cultura e moda. Atrai primeiro um fluxo de visitantes e depois passa-lhes a cultura da leitura. No entanto, tanto quanto puder ver, 90 por cento das pessoas estavam a tirar fotos com câmaras. Apenas alguns leitores escapavam lamentavelmente do grande espaço público e ia até a cafeteria da livraria para pedir uma chávena de café, e então podiam sentar-se pacificamente a ler.


Deixando a livraria Zhongshuge, apanhei o metro, olhei para a paisagem dos dois lados da Ponte do Rio Yangtze e suspirei desejando que houvesse muitas cidades de consumo cultural como Chongqing, que silenciosamente se tornou numa “cidade check-in”. A cidade serve como um espelho para vermos as possibilidades de diferentes visões culturais. A cultura pode de facto mudar os nossos ambientes mas, voltando ao conteúdo espiritual de uma cidade da qual falei no começo deste artigo, ainda não tenho respostas.