Lam Sio Man

Nascida em Macau, atualmente a viver em Nova Iorque. Dedica-se a exposições independentes, à escrita e ao trabalho em educação artística. Em 2019, foi curadora da Exposição Internacional La Biennale Di Veneza, inserida nos Eventos Colaterais de Macau, China. Trabalhou no Departamento de Assuntos Culturais da cidade de Nova Iorque, no Museu dos Chineses na América e no Instituto Cultural do Governo da RAEM. É licenciada pela Universidade de Pequim em Língua Chinesa e Artes, e mestre em Administração de Artes pela Universidade de Nova Iorque.

Discutindo a arte pública (1ᵃ parte)

24a edição | 12 2017

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Tatzu Nishi: Discovering Columbus, 2012. Fonte: Public Art Fund


Durante uma discussão recente com amigos em Xangai sobre a questão da arte pública, fiquei muito surpreendida quando me disseram que em Xangai não existe quase nenhuma arte pública. Xangai é uma das cidades mais dinâmicas da China em termos de arte, onde foram construídos zonas de arte e museus de arte, e onde se realizaram feiras de artes e bienais, então como pode a arte pública ter sido excepção? Isto relembra-me que nossa produção e consumo culturais transpuseram os círculos educativos providenciados pela arte pública, enquanto nos últimos vinte anos, o conceito de indústria cultural desenvolveu-se a alta velocidade a nível nacional. Poderá um pequeno número de galerias de arte ser suficiente para atrair a atenção do público para a cultura e a criatividade. 


A discussão do valor da arte cultural é, por vezes, extremamente abstracta. Porém, quando as pessoas participam fisicamente na arte, o encanto e impacto que a arte lhes traz é profundamente directo. Por isso, um dos métodos mais eficazes de promoção das artes é permitir às pessoas que participem em actividades artísticas, e a arte pública oferece exactamente essa oportunidade: a cidade é precisamente um palco para a arte e para a criatividade, e os habitantes não precisam de entrar num museu mas ainda podem apreciar e participar em actividades artísticas. Isto, naturalmente, produz grandes benefícios para a criação de um ambiente artístico na cidade e para o cultivo de grupos de consumidores de cultura. 


Recordo-me de que há alguns anos, quando visitei Nova Iorque, o que mais me marcou não foram os grandes museus urbanos, nem os musicais da Broadway, mas a arte exibida no Columbus Circle, em Manhattan, intitulada "Discovering Columbus". Tal como diversas outras praças, no centro desta praça ergue-se a estátua de uma pessoa notável, que é o ponto de referência da cidade, uma comemoração da sua história. Contudo, talvez nunca ninguém tenha apreciado de perto esta estátua de Colombo, já que está erguida bem alto. Então, alguns artistas construíram uma pequena casa temporária ao redor da estátua, à qual os visitantes podem subir. Ao entrarem na casa, podem finalmente apreciar a estátua de Colombo a uma curta distância. Obras deste género oferecem às pessoas uma nova perspectiva das coisas que fazem parte da história e da cidade, enquanto dá à arte um significado social mais activo: em vez de estar num museu à espera de ser vista, esta obra entra directamente na vivência da cidade, integrando o espaço e a história, comunicando com as pessoas que residem nesse mesmo tempo e espaço. 


Talvez as pessoas digam que a arte é um produto de um tempo e espaço específicos. Mas parece que com o desenvolvimento de produtos artísticos para comercialização excessiva ou até mesmo a sua capitalização, a arte afasta-se frequentemente da era e do ambiente de criação original dos artistas, tornando-se um objecto de consumo e desejo. Se por vezes aqueles que adquirem arte em leilões a um preço astronómico podem ou não saber apreciar a arte, então quantos de nós que corremos para as galerias de arte e olhamos para as obras-primas de Van Gogh ou Picasso conseguimos realmente comunicar com o trabalho do artista? Esta separação entre a arte e as pessoas, a vida e a sociedade forçou os artistas americanos dos anos sessenta e setenta a quebrarem as “paredes brancas” de museus e galerias de arte e a caminharem de novo nas ruas. 


Também foi neste período em que se formaram algumas das mais importantes instituições artísticas públicas dos Estados Unidos: por um lado, diversos estados e cidades começaram a promover o plano de Percent for Art, que estipulavam que um porcento das despesas em construção pública devia ser dedicado à aquisição de arte pública; por outro lado, criaram-se instituições privadas sem fins lucrativos, como o Public Art Fund ou a Creative Time. O aparecimento destas instituições não só providenciou fundos, como também construiu uma plataforma de colaboração comunitária, que permitiu que a arte pública entrasse em pequenas e grandes cidades americanas. 


No entanto, quando a arte pública beneficia da implementação de recursos públicos, ela deve entrar no campo de visão do público e, naturalmente, ser submetida a uma examinação por esse mesmo público. É preciso estimular o pensamento, mas também permitir a recepção e aceitação do público, isto não só depende da criatividade e visão dos artistas, mas também de considerações sobre o sistema de participação comunitária, a implementação da educação pública e assim por diante. Conclui-se, portanto, que a arte pública é muito mais do que simplesmente mover obras de arte dos museus para as ruas.