Lam Sio Man

Nascida em Macau, atualmente a viver em Nova Iorque. Dedica-se a exposições independentes, à escrita e ao trabalho em educação artística. Em 2019, foi curadora da Exposição Internacional La Biennale Di Veneza, inserida nos Eventos Colaterais de Macau, China. Trabalhou no Departamento de Assuntos Culturais da cidade de Nova Iorque, no Museu dos Chineses na América e no Instituto Cultural do Governo da RAEM. É licenciada pela Universidade de Pequim em Língua Chinesa e Artes, e mestre em Administração de Artes pela Universidade de Nova Iorque.

Quem Paga pela Arte sem ser o Governo?

20a edição | 04 2017

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Philip Huang, artista, encenou uma manifestação sobre como angariar financiamento para um projecto artístico de pequena escala  Fonte da imagem: www.youtube.com/watch?v=TnT6eC0-tV0


Com a chegada de Donald Trump ao cargo de presidente, o sector das artes nos Estados Unidos da América (EUA) começa a temer que o governo vá reduzir drasticamente o apoio financeiro ao National Endowment for the Arts ou mesmo abolir este órgão federal de financiamento de artes, que existe desde a década de 1860. No entanto, mesmo que ele seja extinto, o impacto pode não ser tão grave como alguns imaginam, uma vez que as organizações de artes sem fins lucrativos nos EUA não dependem de financiamento do governo mas, em grande medida, do apoio privado e comercial. Já em Macau, o financiamento privado e comercial para as artes é relativamente escasso, pelo que as organizações sem fins lucrativos tendem a contar com o apoio do governo. A longo prazo, este modo de operar limita o âmbito do desenvolvimento e da adaptabilidade das organizações.


Quando pensamos no financiamento comercial das artes em Macau, é impossível não ter em conta o papel das empresas de jogo. De acordo com os números do relatório anual de 2015, as doações corporativas de empresas de jogo foram destinadas principalmente a instituições de caridade e a instituições educativas, sendo o apoio às artes menos óbvio. Para algumas dessas empresas, a doação para as artes nem sequer figura nos seus relatórios anuais, o que indica que se trata de um tipo de apoio ao qual não dão grande prioridade. Entre as seis maiores empresas de jogo, a SJM é vista como a mais disposta a apoiar as actividades artísticas e culturais locais, ao passo que a Sands China apoia importantes eventos artísticos e a MGM se concentra sobretudo em organizer as suas próprias exposições de arte. Enquanto algumas dessas empresas estão dispostas a patrocinar projectos artísticos, uma análise mais atenta revela que a maioria dos apoios couberam a eventos que incluíam grandes organizações artísticas internacionais. Dadas as suas considerações sobre a viabilidade comercial e o impacto publicitário dos projectos, essas empresas estão muito menos predispostas a apoiar artistas individuais ou grupos artísticos locais de pequena escala.


Na verdade, mesmo nos EUA, onde há mais financiamento comercial para as artes, as empresas preferem patrocinar organizações artísticas mais prestigiadas e de grande escala, tornando difícil aos grupos de artes de menor dimensão e aos artistas individuais obter o tão necessário financiamento. Assim, algumas agências mediadoras envolvidas na promoção do desenvolvimento artístico regional tornaram-se mais empenhadas em incentivar o patrocínio privado. Na área da baía de São Francisco, um programa que visa encorajar o mecenato privado das artes, The Fund For Artists Matching Commissions, é disso um excelente exemplo. Gerido pelo fundo regional, permite a artistas ou grupos artísticos solicitar um apoio de entre 5.000 a 10.000 dólares americanos, sendo que esse montante deve ser acompanhado de uma verba privada no mesmo valor, preferencialmente de um novo patrocinador. De 2004 a 2010, esta modalidade ajudou um total de 181 artistas com 116 encomendas. No total, atraiu 729.254 dólares americanos de doações provenientes de 3.120 mecenas. Os resultados de um estudo sobre este modelo mostram que os antecedentes, valores e incentivos de patrocínio para estes apoiantes são muito diferentes daqueles que podemos encontrar nos habituais patrocinadores das artes. Tais conclusões são claramente reveladoras do ponto de vista da gestão das artes.


Aliás, muitos mecenas que alinham neste modelo são, eles próprios, artistas ou profissionais das artes jovens ou de meia-idade, interessados em questões como justiça social, protecção ambiental e diversidade cultural. As principais razões para quererem apoiar projectos desta índole estão, provavelmente, relacionadas com a sua própria identidade como artistas, ou com o facto de estarem ligados à cultura ou à comunidade em que os projectos apoiados têm lugar. Alguns decidiram os financiamentos em função dos temas ou formatos dos projectos artísticos. Muitos candidatos bem-sucedidos descobriram, para sua surpresa, que as ofertas de financiamento não eram tão difíceis de obter como supunham. Aparentemente, há pessoas na comunidade que partilham dos seus valores e ideias e que estão dispostas a apoiar causas que valham a pena.


O relatório do estudo também destaca uma interessante curta-metragem que incentiva os artistas a identificar os seus próprios patronos. No filme, um artista dá uma palestra para mostrar ao público como obter financiamento para o seu projecto de artes em pequena escala. O seu discurso persuasivo cativa o público de tal forma que, em apenas alguns minutos, muitos elementos da audiência se oferecem para fazer doações. Humor à parte, a curta-metragem passa indubitavelmente a mensagem de que, se estivermos dispostos a explorar, existem realmente pessoas à nossa volta generosas o suficiente para financiar as artes.