Un Sio San

Un obteve a dupla licenciatura em Língua Chinesa e Arte (produção de cinema e televisão) da Universidade de Pequim e o duplo mestrado em Estudos da Ásia Oriental e Estudos da Ásia-Pacífico da Universidade de Toronto nas áreas de investigação em literatura e cinema. Ganhou o prémio de Henry Luce Foundation Chinese Poetry & Translation e foi poeta residente no Estúdio Criativo de Vermont nos EUA. Foi convidada a marcar presença em vários festivais internacionais de poesia tal como o festival realizado em Portugal e trabalhou como letrista da primeira opera interior original de Macau “Um Sonho Perfumado”. Publicou algumas colecções de poemas nos dois lados do estreito e tem-se envolvido no meio académico e em publicação por muito tempo, além de escrever colunas para meios de comunicação em Taiwan, Hong Kong e Macau.


A Musa do México: Encanto para o público da história pessoal

25a edição | 02 2018

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Aqueles que tenham estado na Cidade do México devem ter uma impressão profunda em relação à pintora Frida Kahlo. As fotografias dela, com a sua monocelha, o seu buço óbvio e o seu vestido nacional colorido, bem como os seus auto-retratos em cenário sangrento, podem-se encontrar em todos os cantos desta cidade, que se diz ser a maior do mundo. A figura dela aparece em lembranças e em produtos culturais e criativos do México. Além disso, os rostos dela e do seu marido Diego Rivera, que era também pintor, estão impressos nas notas de 500 pesos. Se a personalidade mais influente das indústrias culturais e criativas de Lisboa fosse o poeta Pessoa, Frida deve certamente ser a da Cidade do México. 


Como fanática de Frida Kahlo, visitei esta grande cidade de pouca segurança para procurar o seu antigo rasto. Embora Frida não tenha um estatuto tão elevado como o mestre de murais Diego na história da arte, a sua vida lendária e os seus trabalhos autobiográficos comoventes são suficientes para torná-la na eterna musa do México. A biografia e adaptação cinematográfica “Frida”, lançada em 2002, permitiu que muitas pessoas não amantes de arte conhecessem esta mulher lendária. A partir daí, muita música, teatro, bailado, pinturas e desenhos de roupa foram inspirados nela (O bailado “Casa Azul” foi encenado no Centro Cultural de Macau em 2011), o que a tornou popular por todo o mundo, sendo os trabalhos dela vendidos com preços de leilão mais elevados entre pintoras do mundo. 


Um terço dos trabalhos de Frida são auto-retratos, através dos quais ela exprime os seus sentimentos em público. Até Picasso se sentiria não ser capaz de se comparar quando deparado com a honestidade de Frida. O seu trabalho autobiográfico não foi pioneiro. Ainda assim, na era dos selfies, da marcação do local onde se encontra, e do abdicar da privacidade, pode-se dizer que ela é o modelo da individualização. O designer de Los Angeles Sam Cantor criou 160 emojis (FridaMoji) com os auto-retratos de Frida como modelo – Que outro artista seria mais adequado que Frida para ser o modelo dos emojis que são utilizados para expressar emoções? 


O escritor Mu Xin disse: “O que toda a grande literatura regista não é a felicidade, mas sim os distúrbios e a revolta”. As grandes obras de Diego que se caracterizam pelo seu cariz público e apresentam a história do México são indubitavelmente estimulantes. Contudo, os quadros autobiográficos de Frida que parecem não ter nada a ver com a cidade, com a história e com a política, integram-se, na verdade, na vida da Cidade do México. Estas obras debruçam-se sobre as dores e o amor, mas ao mesmo tempo ultrapassam as restrições geográficas e espaciais. 


O que é mais pessoal é de facto mais ligado ao mundo. As criações de Frida servem, não intencionalmente, de melhor exemplo neste sentido. A criação literária e artística serve normalmente para serem resolvidas as questões pessoais. enquanto a apreciação literária e artística, por sua vez, permite que os leitores e visitantes procurem as respostas que lhes sejam apropriadas nas obras. Portanto, relativamente à importância de Frida, ela mostra-nos como a influência e os valores culturais da individualização não devem ser subestimados. Quanto à questão de como tornar sentimentos pessoais a universais, isto é muito difícil de concretizar. Por outras palavras, nesta era de reprodução mecânica sem Aura, se a literatura, a arte e os chamados produtos culturais e criativos querem comover e emocionar audiências, então por vezes têm de largar os preconceitos de seguir aquilo que as pessoas gostam de ver e ouvir e o princípio de que os textos são para dar lições de ética e moral. A individualização e a exploração de dilemas pessoais não apenas fornecem um caminho alternativo, mas também tornam as produções mais humanas e expressivas. 


Na minha última refeição na Cidade do México, acidentalmente entrei no restaurante onde Frida e Diego se casaram, o que foi um belo desfecho da minha viagem. Os elementos de atracção de cada cidade que cativam os viajantes são diferentes. Alguns vão pela gastronomia, como pastéis de nata e bifanas; outros alimentam o pensamento. E eu estou com vontade de fazer mais viagens ao México.