No mundo dos NFT Chineses

01 2022 | 47a edição
Texto/Audrey Song Imagens: Shutterstock

A pandemia do novo coronavírus tem vindo a acarretar grandes mudanças, afectando todas as indústrias a múltiplos níveis. Antes da eclosão da COVID-19, vários eventos de arte tinham lugar anualmente na região da Grande Baía Guangdong-Hong Kong-Macau, incluindo a Art Basel Hong Kong, a qual, nos últimos dois anos, passou a ser transmitida online. Foi na sequência desta transição que se deu a explosão dos NFT, a qual desencadeou uma verdadeira onda de entusiasmo, dando rapidamente origem a uma mentalidade de massas nos círculos artísticos. A partir do momento em que vários artistas, como Lu Han, Jiro Wang, JJ Lin e Xu Jinglei, passaram a usar avatares NFT no seu Instagram, esta febre do mundo virtual tomou oficialmente conta do Interior da China.


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Os avatares NFT explodiram nas redes sociais, dividindo-se em diferentes tipos de avatares, que representam diferentes preferências e identidades.


Um NFT (Non Fugible Token) é uma “ficha não fungível”, ou seja, que não pode ser substituída. Em comparação com os NFT, as moedas digitais Bitcoin (BTC) ou Ethereum (ETH) constituem fichas fungíveis, o que significa que têm sempre o mesmo valor, independentemente de quem as possua, tal como acontece com as notas de RMB100 emitidas pelo Banco Central. Por sua vez, um NFT é único, diferenciando-se de todos os outros NFT e não podendo ser trocado. Originalmente, havia apenas fichas fungíveis, mas, em 2017, para resolver um problema de compatibilidade de um jogo chamado CryptoKitties, o seu fundador Dieter Shirley propôs o conceito de NFT e criou as fichas não fungíveis. Naquela altura, as moedas digitais estavam em plena ascensão, tendo o valor da BTC passado de USD5.000 para USD20.000 no espaço de dois meses. Apenas quatro anos mais tarde, em 2021, a pandemia viria a contribuir para inaugurar a era dos NFT.


A arte dos NFT como segmento de mercado


Opensea是開放予任何人免費建立並購買NFT的平台(圖片截自官方網站).png

A Opensea é uma plataforma de NFT aberta a todos, permitindo a qualquer pessoa no mundo criar gratuitamente e adquirir NFT. (imagem extraída do website oficial)


Até à data, as principais plataformas de comercialização de NFT existentes, como a OpenSea, a Rarible, a SuperRare, a MakersPlace, a Nifty Gateway, a Zora, Foundation e a Coinbase NFT, encontram-se todas no exterior. Cada plataforma não só possui as suas próprias características, como também define as suas próprias regras do jogo. Por exemplo, a OpenSea, tal como o próprio nome sugere, é aberta a todos, permitindo a qualquer pessoa criar gratuitamente e adquirir NFT. Outras plataformas ou funcionam por convite ou requerem a partilha de obras pessoais e o envio do currículo. Entre todas as cidades da região da Grande Baía, Hong Kong foi, como sempre, a primeira a reagir ao fenómeno. No início de 2021, a HKD lançou a primeira plataforma de comercialização de NFT da China. Para facilitar a comercialização de várias moedas fiduciárias e de fichas digitais, foi criada a plataforma OTC para fins de comercialização de moedas fiduciárias. Em Setembro, a Start Art Gallery, “a primeira galeria física de NFT do mundo”, foi oficialmente inaugurada no centro comercial K11 em Hong Kong. Por se tratar de uma galeria de NFT, o modo de visualização dos NFT tem, obviamente, as suas especificidades. Para além de ecrãs, a galeria dispõe igualmente de tecnologia de realidade virtual (RV), de modo a permitir ao público apreciar a arte dos NFT por meio de alta tecnologia. A galeria expõe obras de artistas profissionais de NFT, publicando e comercializando também obras de artistas contemporâneos. No actual contexto de expansão dos NFT, Hong Kong volta assim a evidenciar a sua vantagem regional como zona franca.


No Interior da China, a onda dos NFT tem vindo a gerar uma proliferação de empresas e instituições ligadas aos mesmos, dominando rapidamente os sectores da arte, da música e da criatividade. Em Abril de 2021, foi criado o TR Lab, uma plataforma de arte NFT co-fundada pela Dragonfly Capital, pela vice-presidente não executiva da Christie’s e pelos fundadores do Museu de Arte Rockbund (RAM) de Xangai, do Artsy e da Feira de Arte Contemporânea ART021 de Xangai. Distinguindo-se pelas suas excelentes bases artísticas, o TR Lab conseguiu vender o seu primeiro NFT, nomeadamente, uma obra de Cai Guoqiang intitulada Eternidade Transitória—101 Ignições de Pinturas de Pólvora (Transient Eternity—101 Ignitions of Gunpowder Paintings), ao preço de 2,5 milhões de dólares, apenas três meses após a criação da plataforma. Posteriormente, os autores do livro IA 2041: Dez Visões para o Nosso Futuro, Chen Qiufan e Kai-Fu Lee, colaboraram na criação de vários NFT inspirados nas visões do futuro num mundo dominado pela inteligência artificial descritas no livro. Por sua vez, o CryptoArt.Ai, um mercado dedicado ao segmento da arte, fundado há menos de um ano, recebeu 2,4 milhões de dólares em financiamento institucional, tendo, desde Julho de 2021, reunido 812 artistas e exposto 628 NFT. Destaca-se ainda a plataforma de cripto arte mais antiga do Interior da China, a BlockCreateArt (BCA), fundada por Sun Bohan. A BCA, a qual recebeu financiamento de um investidor-anjo no valor de 2 milhões de dólares, inclui uma secção própria de emissão de NFT, a plataforma de comercialização Meta Opus, a Galeria BCA (galeria de cripto arte) e o Estúdio BCA (estúdio de IP), tendo ainda lançado, em colaboração com os Zonff Partners, o Vulcan DAO, o primeiro fundo especial de cripto arte da Ásia. No que diz respeito ao segmento de mercado da cripto arte, o Interior da China tem vindo a reagir activamente ao mesmo, à medida que vai apalpando o terreno para desenvolver o sector de modo adequado às condições do país.


A febre dos NFT na sociedade


As obras de arte virtuais vieram quebrar as barreiras das obras de arte convencionais, tendo o valor estético sido destronado em favor do valor lúdico e social. Tomando como exemplo o projecto Merge, da autoria do artista Pak, após um período de licitação de 48 horas, Merge tornou-se o NFT mais caro de sempre, sendo vendido por um total de 584 milhões de RMB. No entanto, esta obra avaliada em 584 milhões de RMB corresponde, na verdade, a 312.686 bolas, ou unidades de massa. Estas bolas que, na aparência, não têm nada de especial custam 299 dólares cada uma. O que é curioso é que, se compararmos as bolas a um pincel, constatamos que o criador desta obra é o conjunto de 28.983 compradores que participaram na licitação, pois, independentemente do número de bolas que cada pessoa adquiriu, todas as bolas adquiridas acabarão por ser fundidas numa só bola segundo o princípio de que “os peixes pequenos são engolidos pelos peixes grandes”, transformando a obra de cada vez que uma bola é adquirida e agregada. A obra vai assim sofrendo alterações com cada compra e venda efectuada pelos compradores, processo este que faz com que os licitantes se sintam completamente envolvidos, dando origem a um tipo de interacção social intrigante.


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As obras de arte ligadas a um NFT permitem a verificação do proprietário legal e a autenticidade das obras com base nos dados armazenados em blockchain


São precisamente as qualidades únicas da cripto arte que facilitam o contacto entre as obras de arte e os compradores no mundo virtual. Por exemplo, os populares avatares NFT parecem ter-se tornado uma marca de identidade para os compradores. Quando, no mundo virtual, o “eu” já não é um “eu”, mas sim um macaco, é natural que se forme uma comunidade de macacos. Daí que compradores reais tenham estabelecido comunidades deste tipo, seja de macacos, de pinguins, ou de gatos. Cada comunidade tem a sua própria linguagem e todas apelam à adesão de novos membros, dado que, quanto mais membros a comunidade tiver, maior será o valor e a competitividade dos seus avatares.


Actualmente, a febre dos NFT afecta apenas uma minoria de aficionados no Interior da China, sendo a opinião pública muito variável. Para algumas pessoas, os NFT são um sinal de que o futuro já chegou; para outras, são apenas mais uma bolha prestes a rebentar. A partilha de experiências de compra de NFT no Zhihu ou no WeChat por parte de compradores entusiásticos nunca deixa de incitar críticas impiedosas, o que levou os membros de muitos círculos de aficionados a adoptar o modo de adesão por meio de digitalização de um código QR. Alguns grupos definiram como critério de admissão a posse de, pelo menos, um NFT, havendo ainda grupos que requerem uma recomendação por parte de um membro. Sejam quais forem os critérios, a adesão a um grupo assemelha-se à entrada numa cidade muralhada: o mundo passa a ser visto de forma diferente por quem está dentro e por quem está fora.


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Em 2021, houve uma explosão de NFT, os quais passaram a ser utilizados em diferentes sectores, incluindo no mundo dos jogos, no sector financeiro e no domínio das artes.


No entanto, tarde ou cedo, a festa tem de acabar. Em 2021, considerado o ano inaugural dos NFT, terão estes atingido o auge do seu valor? O que se seguirá a esse auge é, para já, uma incógnita. De acordo com os dados disponíveis, os valores globais dos NFT no final de 2021 não são, efectivamente, tão expressivos como os valores de meados do ano. Se se der o caso de os NFT voltarem a atingir valores razoáveis, é impossível prever quantos de nós persistirão pelas suas características lúdicas e quantos desistirão pelas suas características sociais.