Joe Lei

Compositor e letrista em Hong Kong e Macau. Escreveu mais de 300 canções. É Capricórnio e gosta de chamar as coisas pelos nomes.

Inspiração criativa e aprendizagem

5a edição | 05 2015

Muitas pessoas perguntam: a composição musical é algo que se pode ensinar? Sim, certamente. Comecei a dar aulas de composição de música pop há dez anos na Star House em Tsim Sha Tsui; depois dei aulas de composição e escrita lírica na Baron School of Music. Apesar de a carreira de ensino em Hong Kong ser bem remunerada, deixa pouco tempo para fazer outras coisas no final de cada dia longo e passado a viajar de um lado para o outro. Desde que comecei a ensinar composição musical em Macau este ano, o trajecto que faço diariamente para o trabalho é muito mais calmo. Aqueles que se querem inscrever neste tipo de cursos (por exemplo, composição musical) devem cumprir os seguintes requisitos:


1. Uma boa base em teoria musical – o equivalente ao Nível 5 do ABRSM;

2. Tocar pelo menos um instrumento musical, preferencialmente o piano;

3. Não ser tímido no trabalho de composição. A maioria dos estudantes gosta de compor recorrendo a instrumentos musicais, mas eu penso que a voz é o melhor instrumento. No entanto, muitos alunos têm alguma resistência em utilizar o método bocca chiusa quando compõem. Os asiáticos são introvertidos por natureza;

4. Ter uma mente aberta para ouvir vários géneros musicais, caso contrário as composições em que trabalham abrangerão uma variedade de estilos muito reduzida;

5. Estar disposto a ser criativo. É verdade que alguns estudantes gostam de tirar notas e têm alguma relutância em meter mãos ao trabalho quando chega o momento de criar – provavelmente um resultado desastroso da educação condescendente em Hong Kong e Macau;

6. Ter computador com um software de música instalado.


Se os estudantes tiverem estas seis faculdades descritas acima, provavelmente conseguirão entrar no curso. Alguns poderão ainda questionar-se se a criatividade é algo que pode ser ensinado. A questão é levantada na medida em que nos deparamos frequentemente com romances ou filmes sobre génios, que nos levam a acreditar que todos os artistas são “os escolhidos”. Se viu o filme de Stephen Chow, Flirting Scholar, provavelmente terá pensado que os académicos talentosos encontram as palavras certas para os seus poemas sem fazer qualquer esforço. E se vir Amadeus, provavelmente acreditará que só um génio conseguiria criar sem grande esforço uma obra-prima que perdurasse ao longo dos tempos – como se esse génio tivesse apenas de ter nascido, sem nunca ter sido ensinado. De facto, este é um grande equívoco no que diz respeito à criatividade.


Claro que existem artistas que assinam grandes obras sem nunca terem tido formação profissional, mas são uma minoria. A verdade é que aqueles que têm formação e experiência estão em vantagem em relação aos que não têm. Com uma base mais sólida, a carreira criativa de um artista será mais longa e estável. O ponto fundamental é que ninguém pode contar apenas com a inspiração para se manter criativo ao longo da carreira.


De facto, trabalhar nas indústrias criativas requer competências especializadas, profundidade dos conhecimentos e muito empenho, tal como acontece noutras indústrias. Não ponhamos a indústria criativa num pedestal: não existe nenhum deus que ande por aí a atingir-nos com uma seta da inspiração e a estimular as nossas mentes; como também não existe um artista que consiga criar uma obra de arte única do nada, sem ter sido ensinado. Na maioria das vezes, estudamos, analisamos e refazemos trabalhos antigos, melhorando-os ou reorganizando-os. Isto acontece principalmente no início de uma carreira criativa. Os primeiros trabalhos de Mozart foram muito influenciados por Haydn, e os de Beethoven por Mozart. Bons trabalhos resultam muitas vezes de tentativas e erros cometidos através da imitação e da prática.


Conheço vários artistas que são famosos pelas viagens que fazem ao estrangeiro à procura de inspiração. No entanto, não parece que os resultados criativos tenham melhorado muito com estas viagens. Deixo aqui algumas humildes observações: em vez de procurarem inspiração no estrangeiro, estudem seriamente ao piano ou à secretaria e procurem desconstruir as obras-primas, ou inscrevam- se num curso criativo. São formas eficazes que podem ajudar a desenvolver a criatividade de cada um. Mas, claro, estes métodos podem não ser tão fixe como encontrar inspiração numa viagem ao estrangeiro.