Joe Tang

Vencedor do Prémio Literário de Macau e o Prémio de Novela de Macau, Joe Tang é escritor e crítico de arte. Assinou vários romances, incluindo The Floating City e O Assassino, traduzidos para Inglês e Português. Publicou também peças de teatro, entre elas Words from Thoughts, Philosopher’s Stone, Journey to the West, Rock Lion, Magical Monkey e The Empress and the Legendary Heroes.


Listas de Leitura dos Presidentes

20a edição | 04 2017

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Barack Obama, ex-presidente dos Estados Unidos da América (EUA), foi entrevistado pelo The New York Times mesmo antes de deixar o cargo. Declarou que, nos seus oito anos na Casa Branca, mal conseguiu dormir cinco horas por noite, mas teimou sempre em ler durante uma hora antes de se deitar. Não é novidade para ninguém que Obama é um ávido leitor. Nas férias, os livros que comprou e recomendou tornaram-se o centro das atenções. Um dos momentos mais ternos foi quando deu à sua filha Malia, de 18 anos, um Kindle cheio de livros que queria partilhar com ela. Entre eles estão: Cem Anos de Solidão, do realista mágico latino-americano Gabriel García Márquez, O Caderno Dourado, romance feminista de Doris Lessing, Os Nus e os Mortos, do activista social norte-americano Norman Mailer, e The Woman Warrior, da autora sino-americana Maxine Hong Kingston. A lista de leitura não é apenas uma prova do amor de um pai. É também a expectativa de um pai de que uma filha se torne numa mulher capacitada e confiante quando crescer.


Somos o que lemos. Ler não é algo difícil de fazer, e não há certo ou errado quando toca à leitura. Trata-se puramente de um hábito e de uma escolha pessoais. Embora os livros que lemos e quantos lemos sejam preferências e assuntos estritamente privados, as listas de leitura de pessoas que podem ter um impacto significativo na sociedade, como um presidente ou um empreendedor, podem ser o centro das atenções na esfera pública. Pelas suas listas de leitura (e, claro, tais listas são manobras publicitárias para ajudar a projectar as suas opiniões), começamos a saber mais sobre essas figuras públicas, que geralmente tendem a manter uma certa distância. Até certo ponto, a divulgação das suas listas de leitura pode ser vista como parte das suas responsabilidades sociais.


Consta que George W. Bush, ex-presidente dos Estados Unidos, é um leitor voraz (lendo 40 a 100 livros por ano), embora fosse amiúde descrito pela comunicação social como um “cowboy”. Além disso, milionários como Bill Gates, Warren Buffett e Mark Zuckerberg são amantes de livros e promovem proactivamente uma cultura da leitura. As suas listas de livros são muitas vezes uma referência importante para a maioria de nós. Pelo contrário, Donald Trump, o novo e controverso presidente dos Estados Unidos, não tem apetite por ler livros, segundo Tony Schwartz, o ghostwriter de Trump e creditado co-autor da sua autobiografia Trump: The Art of the Deal. Schwartz disse à The New Yorker que nunca viu um livro na secretária de Trump, nem em qualquer outro lugar do seu escritório, nem no seu apartamento. Ele reparou que o actual presidente dos EUA nunca falava sobre livros e disse duvidar de que Trump tenha alguma vez lido um. Isto faz-me pensar se as políticas anti-imigração e anti-livre comércio de Trump, bem como a sua ideologia isolacionista, não estarão relacionadas com a sua aparente falta de interesse na leitura.


No entanto, como mencionei anteriormente, as listas de leitura são referências úteis ao mesmo tempo que são manobras publicitárias. Devemos ter as nossas próprias posições e opiniões sobre aquelas preferências de leitura. Certa vez, vi uma banda desenhada que retratava três pessoas de pé sobre três pilhas de livros com diferentes alturas, e aquilo que a sua vista alcançava diferia substancialmente. Acho que a tira de BD é semelhante aos três estágios da vida na filosofia chinesa: do ponto inicial em que “uma montanha é uma montanha, não interessa por quanto tempo a olhe, e a água é água, não importa quão arduamente a observe”; passando por “uma montanha já não é mais uma montanha, mesmo que continue a olhá-la, e a água já não é mais água, independentemente de continuar a fixá-la”; até à fase final, em que “uma montanha ainda é uma montanha, e a água ainda é água”. É através da leitura extensiva que podemos enriquecer a nossa vida e descobrir a verdade, a bondade e a beleza num mundo incerto e confuso. Uma sociedade civil madura e os seus elementos não seguiriam cegamente o que os políticos ou as celebridades lêem. As suas listas de leitura são apenas uma referência e devemos fazer o nosso próprio juízo lendo o que há a ler.