Passeio pelo património com poesias—arte comunitária em Macau

04 2015 | 4a edição
Texto/Tai Chou Wai

São várias as cidades do globo que estão a apostar no envolvimento da comunidade em actividades artísticas e culturais, de forma a enriquecer e criar uma atmosfera cultural local. Macau não é excepção e, nos últimos anos, tem seguido esta tendência. Grupos de arte do território aproveitam os locais declarados património mundial para estabelecer uma ligação entre a arte, a história e a comunidade. O projecto Passeio pelo Património com Poesias, que já vai na terceira edição, explora a cidade da perspectiva dos artistas, que olham Macau através da literatura, instalações, actuações ou visitas guiadas nunca antes vistas.


Visitas guiadas diferentes


O Passeio pelo Património com Poesias, organizado pela Associação dos Embaixadores do Património de Macau, é um dos projectos subsidiados pelo Plano de Financiamento Artes na Comunidade do IC do Governo da RAEM. O evento, que terminou em Março, teve este ano como tema “Músicas aos Poços de Água” e incluiu uma visita guiada, abrangente e com muita procura, que percorria Macau pelas fontes de água da cidade, lendas de viagem e atracções do antigo bairro de São Lourenço. Este programa de duas horas foi muito mais do que uma simples viagem turística—os participantes tiveram oportunidade de redescobrir Macau e interagir com artistas residentes através das poesias e das artes performativas. Ao contrário da maior parte das visitas guiadas, que se destinam aos turistas, neste tipo de actividades, a população local é o principal público-alvo. O director de programas Nero Lio nota: “A visita guiada `Músicas aos Poços de Água´ é mais do que simples turismo. As habituais visitas guiadas têm uma abordagem que não é recíproca. Estas, pelo contrário, são actividades que juntam actuações artísticas e a interacção com os participantes. Este evento já é organizado há três anos e várias pessoas disseram-nos que descobriram bairros que não conheciam, o que acabou por despertar o interesse pela história de Macau”.


O itinerário do evento incluiu este ano a Igreja e Seminário de São José. Durante a noite, os participantes exploraram o interior deste espaço numa rara oportunidade de ficar a conhecer o trabalho levado a cabo neste lugar sagrado. “A Igreja e Seminário de São José estão geralmente fechados ao público, o que fez desta actividade um evento exclusivo. A visita tem um custo de 120 patacas por pessoa. Não é barata, mas tem estado esgotada ao longo dos anos”, diz o responsável.


Neste tipo de eventos, continua Lio, é fundamental encontrar um equilíbrio entre a arte, o entretenimento e a criatividade. Mas assegurar a qualidade da visita ainda é mais importante. “Recebemos um máximo de 25 pessoas por visita guiada porque, em primeiro lugar, as ruas de Macau são estreitas e não aguentam tantos participantes e, depois, porque é mais fácil criar alguma intimidade entre as pessoas quando se formam grupos pequenos. Afinal de contas, não estamos a falar de passeios rápidos com curtas paragens. Preferimos ter mais pessoas a trabalhar com um maior número de grupos, até para que os participantes possam aproveitar ao máximo o dinheiro que gastaram.”


Actividades culturais gratuitas para encorajar a participação da comunidade


Três actividades gratuitas foram incorporadas este ano no Passeio pelo Património com Poesias: “Beber chá através das poesias”, “Excursão guiada” e “À procura de diversão na comunidade”. Hope Chiang, directora artística do Passeio pelo Património com Poesias, diz: “Ao organizar estas actividades esperamos que, em vez de se explorar a cidade através do que foi escrito sobre ela, os participantes possam fazê-lo de forma mais profunda”.


“Beber chá através das poesias” foi um momento de partilha de poesias sobre Macau, em que guias turísticos ou actores leram versos espalhados por vários locais da cidade; a “Excursão guiada” permitiu interpretar os pátios centenários de São Lourenço; e “À procura de diversão na comunidade” foi uma caça ao tesouro, em que os participantes, guiados por um mapa, ficaram a conhecer a evolução deste bairro à medida que procuravam antigas lojas nesta área.


As actividades gratuitas fazem parte de uma estratégia de marketing do “Passeio pelo património com poesias” e têm como objectivo atrair aqueles que raramente participam em eventos culturais ou que têm interesse por história e cultura. Como o conteúdo do evento é acessível a todos, muitos residentes da Rua de São Lourenço também se juntaram à experiência.


“Vivo na Rua de São Lourenço há muitos anos e não sabia que estes lugares existiam. Fiquei com vontade de aprender mais sobre o local onde vivo”, disse Chan Mei Sim, uma das participantes.


Além disso, residentes e lojistas da Rua de São Lourenço ajudaram os mais de 80 voluntários na fase inicial de recolha de informação e entrevistas de rua.


Lio comenta: “Isto é exactamente aquilo que queremos alcançar com este evento. Através do trabalho de campo e das actividades culturais, os residentes reforçam o sentido de pertença ao espaço onde vivem e, entretanto, vai-se criando um ambiente cultural no seio da comunidade”.