Cheong Sio Pang

Cheong vive em Pequim, trabalha em investigação académica e gosta de escutar música clássica. As suas publicações incluem An Oral History of the Concert Band in Macao. Ele é também o autor de Macau 2014 – Livro Musical do Ano e Macau 2015 – Livro Musical do Ano. Cheong adora aprender.


Residência artística de Verão

8a edição | 08 2015

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Participei recentemente numa residência artística organizada pela Fundação Renaissance de Hong Kong. Ao longo de seis dias, as nossas actividades incluíram oficinas de vídeo, literatura, música e teatro, assim como seminários, actividades criativas, exibições de filmes, leituras de poesia, concertos, sessões de debate e, no final, um grande evento artístico. Cada equipa tinha de criar um projecto de palco com base no tema “livre”.


Os participantes, provenientes do interior da China, Hong Kong e Macau, eram maioritariamente estudantes universitários e profissionais ou amadores do mundo da arte. Como tal, a grande maioria tinha uma sólida formação em arte. Ao longo de seis dias e seis noites, os participantes combinaram poesia, música, vídeo e arte corporal, criando obras que incluíam elementos de cada uma destas formas de arte. Senti-me muito bem com esta residência, já que percebi que ainda conseguia trabalhar com estudantes, apesar de ter deixado a escola há tanto tempo. Além disso, foi inspirador ver o desejo criativo de todos os participantes. Na arte, a criatividade é sempre o elemento mais importante, as qualificações são secundárias. A criatividade ousada de todos os participantes foi o que mais me sensibilizou.


Durante os debates, apercebi-me de como os participantes eram ponderados e corajosos. Um dos pontos em discussão foi o tema da residência: “livre”. De uma perspectiva sociológica e classista, a luta de classes, tal como é descrita por Marx, tem como objectivo libertar as massas do controlo dos capitalistas, com vista a uma sociedade sem classes. Mas a história veio demonstrar que isso é extremamente difícil e que não nos pode tornar “livres”. O Existencialismo, que teve origem durante a Revolução Industrial, descreve a forma como os humanos se tornaram pequenas peças de uma gigante máquina, perdendo as suas próprias identidades. A existência humana é insignificante num contexto histórico geral. O budismo distingue o ser-se livre do levar-se uma vida sem obstáculos. O budismo maaiana ensina seis paramitas, ou virtudes, que restringem a liberdade de uma pessoa. São elas: generosidade, disciplina, resistência, diligência, concentração e sabedoria. Por isso, do ponto de vista do budismo, uma pessoa deve aceitar as restrições à sua liberdade de forma a alcançar a iluminação. Só depois do aperfeiçoamento das paramitas, poderá ser alcançado um mundo indolor, o vazio – a verdadeira liberdade. Nestas três interpretações de liberdade, o ponto comum é o controlo, a diversos níveis. O vasto alcance histórico do marxismo, a abordagem individualista do budismo e a base filosófica do existencialismo são diferentes formas de explorar a ideia do ser-se livre e da transformação do sentido da identidade individual em tempos de grandes mudanças.


Durante a residência, senti verdadeiramente a importância de deixar diferentes elementos da arte colidir entre si. Afinal de contas, o sentido artístico está presente em qualquer pessoa, à espera de uma reacção química no momento em que se dá uma colisão, permitindo que uma ideia criativa se transforme em realidade e crie bases para o desenvolvimento das artes. Nos últimos anos, deram-se grandes avanços na promoção das indústrias culturais e criativas em Macau. Para os criativos, é essencial a existência de uma plataforma interactiva para comunicar e aprender com outras pessoas. A sociedade vai progredindo e chegará a um ponto de maior exigência ao nível da realização espiritual. Só através de discussões e momentos de partilha é que a criatividade se poderá manifestar verdadeiramente. A educação não se deve reduzir ao simples acto de ensinar, mas deve envolver discussões entre pares. Eu diria mesmo que uma residência artística deste género em Macau seria muito benéfica para o desenvolvimento das artes locais e de artistas mais ousados e criativos.