Ron Lam

Escritora a residir no Japão, especializada em design, lifestyle e jornalismo de viagem, Ron trabalhou anteriormente como editora das revistas MING Magazine, ELLE Decoration e CREAM.


Revitalização das comunidades japonesas

6a edição | 06 2015

“À medida que a população continua a envelhecer, o seguro nacional de saúde vai ficar cada vez mais caro porque menos pessoas vão contribuir”, disse num tom preocupado um dos meus amigos japoneses enquanto estávamos sentados debaixo de lindas cerejeiras em flor.


O problema do envelhecimento da população no Japão é realmente preocupante e não apenas em termos do seu programa de seguro nacional de saúde. Também vai criar problemas de políticas para o sector laboral, cuidados de saúde e habitação, já que cada vez mais idosos vivem sozinhos. Outro problema prende-se com o facto de cada vez mais jovens estarem a abandonar a sua terra natal, fazendo com que muitas áreas do Japão tenham apenas habitantes idosos. Em alguns casos, depois das pessoas mais velhas morrerem, as suas casas são literalmente abandonadas e alguns lugares transformam-se virtualmente em cidades fantasma. De que forma podem estas áreas ser revitalizadas? Algumas organizações estão à procura de respostas para esta questão.


Um exemplo bem conhecido deste tipo de revitalização é Shikoku, uma rede de ilhas que inclui Naoshima, Toshima, Inujima, entre outras. Uma organização sem fins lucrativos liderada por Soichiro Fukutake conseguiu tornar este conjunto de ilhas do Mar Interior de Seto num grupo de ilhas artísticas internacionalmente conhecido. Visitantes de todo o mundo vêm ver os trabalhos de arquitectura de Tadao Ando, com é o caso do Museu de Arte de Chichu e o Benesse Art Site, ou a abóbora gigante feita por Yayoi Kusama num barco abandonado. De três em três anos, o Festival Internacional de Arte Setouchi é organizado nesta região. Alguns habitants japoneses originários destas ilhas ou de outras cidades viram ali uma oportunidade para conhecer pessoas de todo o mundo, e decidiram ficar e abrir cafés ou pousadas, dando um novo fôlego a esta região.


Mas nem tudo é perfeito. Há dois anos fui a Inujima em trabalho. Havia um plano para transformar uma fábrica de ferro-velho num espaço de arte. Esta área fora em tempos um pátio onde vários habitantes idosos da ilha brincaram durante a sua infância. Estas pessoas ficaram desiludidas com o facto de o espaço, carregado de memórias, ter sido de repente vedado, impedindo a entrada da população.


Li recentemente a tradução chinesa do livro Community Design de Ryo Yamazaki. Yamazaki é um consagrado designer comunitário do Japão. No livro, a descrição de Ieshima tocou-me profundamente. Ieshima, que era originalmente uma cidade que subsistia em torno de uma pedreira, começou a perder população com o desaparecimento daquela indústria. Yanazaki levou estudantes à ilha e aproveitou o olhar de quem desconhece o local para descobrir as características únicas de Ieshima, como por exemplo o facto de frigoríficos abandonados serem utilizados para armazenamento na berma das auto-estradas. Era algo comum para os locais, mas estranho para os estudantes. Os estudantes criaram folhetos e postais de Ieshima e distribuíram-nos pela população de Kobe e Osaka, principalmente por estudantes universitários. A acção não só ajudou a divulger Ieshima junto de muitas pessoas, como reforçou o amor dos habitantes pela sua ilha. O mais comovente foi o facto de um grupo de mulheres locais ter criado uma organização sem fins lucrativos para desenvolver e vender bens produzidos na ilha, utilizando depois esses fundos para fins comunitários. A população de Ieshima mudou o destino da ilha.


Isto leva-nos a uma questão: qual é o objectivo da revitalização de um local? A ideia é que ele prospere novamente ou é permitir que os seus habitantes tenham um estilo de vida mais interessante? O que interessa é o lugar ou as pessoas? Claro que estas hipóteses não têm necessariamente de se excluir umas às outras, mas trata-se de perceber qual delas é a mais importante. Afinal de contas, seja por razões económicas ou em prol da população, qualquer projecto de revitalização deve ter em conta os melhores interesses da comunidade local, porque de outra forma será inútil.