Joe Lei

Compositor e letrista em Hong Kong e Macau. Escreveu mais de 300 canções. É Capricórnio e gosta de chamar as coisas pelos nomes.

A revolução musical e insurrecta no YouTube

3a edição | 03 2015

Com a evolução dos meios de comunicação, ídolos glamorosos de outros tempos estão a começar a desaparecer. A generalização da tecnologia também influenciou de várias formas a indústria da música. De que forma é que os recursos online disponíveis estão a influenciar o destino de quem canta?


YouTube gera concorrência intensa


Quando era jovem, lembro-me de ver um programa musical transmitido nas tardes de domingo no canal Jade da TVB. Nessa altura, poucos programas apresentavam vídeos da Europa, Estados Unidos da América ou Japão. Nessa época, costumava sentar-me à frente da televisão todos os domingos para ficar a saber quais eram as últimas novidades do mundo da música. Para estudantes que não tinham a possibilidade de comprar discos, como era o meu caso, os programas de televisão e de rádio eram os principais canais disponíveis para os jovens ávidos de música se manterem actualizados. Ouvir música era um acto muito passivo na altura: como tínhamos acesso apenas às escolhas dos produtores da TV e da rádio, era muito difícil ouvir outros tipos de música para além do pop cantonês.


 Entretanto passaram-se 20 anos – agora provavelmente ninguém se sentaria à frente do rádio à espera que o DJ pusesse a tocar as suas músicas preferidas. O YouTube veio alterar a forma como as pessoas interagem com a música: apenas uns clicks no iPad e estão disponíveis os sons que queremos, sejam temas europeus, americanos, japoneses ou sul-coreanos. As pessoas podem escolher tão facilmente o género ou a origem das canções que querem ouvir, que o simples acesso à música já não é celebrado da mesma forma que era antes. A variedade incrível de temas disponíveis acabou por fazer com que os fãs se apercebessem de que há sempre alguém melhor – seja na forma de cantar, na aparência física ou mesmo na qualidade dos telediscos.


Como disse Dayo Wong Tze-wah no seu 2014 Talk Show, estamos na era da globalização e só os melhores podem chegar à ribalta. Antigamente, a exposição através dos meios de comunicação era limitada e os fãs tinham pouco termo de comparação. Mas os tempos mudaram. Hoje, a concorrência não chega apenas dos músicos da região, mas de todo o mundo. Ninguém se mostraria solidário com factores desfavoráveis como pequenos mercados ou produções de custo reduzido. É-se facilmente abandonado se não se está à altura dos padrões globais. Basta olhar para os inúmeros ídolos que a Coreia do Sul está a criar ou para todas as estrelas que aparecem nos reality shows de música no Interior da China. Quando a competição vem de todo o lado, não se pode culpar os outros mas apenas nós próprios por não sermos suficientemente bons aos olhos do público.


Juventude de Hong Kong está a perder o orgulho


 Nas décadas de 1970 e 1980, a população de Macau ou do Interior da China provavelmente diria que os habitantes de Hong Kong eram arrogantes e tinham orgulho nisso. E é verdade que este orgulho tinha muita razão de ser: quando a música de Hong Kong e a indústria cinematográfica passavam pelo seu melhor momento, Macau, sem um único trabalho original, podia apenas manter-se à margem e sentir inveja. Hong Kong correspondia a progresso, riqueza e prosperidade, enquanto Macau e o Interior da China eram vistos como pobres e retrógrados.


Mas os tempos mudaram. A riqueza chegou ao Interior da China e aos portos vizinhos. Em Hong Kong as coisas já não são o que eram: a economia está a piorar e a população – principalmente a geração mais nova – perdeu esse orgulho. “Made in Hong Kong” já não é um rótulo de que tenha orgulho. Quando se perde o orgulho na própria cidade, então os seus ídolos e cantores perdem esse orgulho também. Para fazer renascer a indústria musical de Hong Kong, a prioridade é fazer com que a cidade volte a ganhar confiança – algo que também não pode ser alcançado à força. (Continua)