Ron Lam

Escritora a residir no Japão, especializada em design, lifestyle e jornalismo de viagem, Ron trabalhou anteriormente como editora das revistas MING Magazine, ELLE Decoration e CREAM.


Made in Japan

4a edição | 04 2015

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Kanaami lamp desenhado por OeO


Num documentário que vi na televisão no Japão, Kouno, um senhor japonês na casa dos 40 anos, aparece aprumado no seu fato em Shimokitazawa, uma área de Tóquio conhecida pela quantidade de boutiques de moda. Kouno entra numa loja especializada em produtos locais de marca e fala com o gerente do estabelecimento, um homem de rabo-de-cavalo e uma longa barba.


O responsável retira detrás da caixa registadora uma camisola branca e comprida de capuz e mangas finas. O homem explica que o design apertado das mangas faz com que estas não deslizem até às palmas das mãos, o que pode tornar o movimento muito mais prático. “Gostava de criar a minha própria marca de moda, mas não encontro fabricantes a quem possa encomendar pequenas quantidades”, diz o gerente, referindo ainda que o ideal nesta fase seria produzir dez exemplares de cada peça. Mesmo não se sendo um conhecedor da indústria, qualquer espectador de televisão como eu consegue entender a dificuldade em encontrar alguém que aceite pequenas encomendas. Mas, mesmo assim, Kouno pega na camisola, leva-a para o trabalho e discute o assunto com colegas mais experientes na indústria do vestuário. Juntos, começam a fazer moldes. A próxima cena passa-se no escritório do fabricante. Parece que o sonho do gerente da boutique se tornou realidade.


A agência Sitateru, liderada por Kouno, é a empresa que faz a ligação entre o gerente e o fabricante. Aqui, não só se trabalha muito para criar as dez peças de roupa e realizar o sonho do responsável da loja mas, mais importante do que isso, para se dar mais oportunidades aos pequenos negócios de manufactura no Japão.


Os pequenos negócios e indústrias artesanais, que continuam a sofrer com a economia débil, cortam em todas as despesas possíveis ou acabam por fechar as portas. Porém, agências como a Sitateru começam a aparecer por todo o lado no Japão. Os clientes para quem trabalham são pequenos negócios e artesãos. Estas empresas, que têm uma nova perspectiva sobre a forma como as indústrias tradicionais podem fazer negócio, servem de intermediárias entre os designers e as pequenas empresas ou entre os fabricantes de pequena escala e o cliente final.


“Made in Japan” e “Feito à mão no Japão” são dois dos programas que têm em vista a revitalização das artes locais e da indústria artesanal. Shimokawa Kazuya, fundador do “Made in Japan”, acredita que um estilo de vida prático não é necessariamente o melhor caminho para uma boa vida. Kazuya descobriu que os produtos do dia-a-dia que adoptam um design tradicional japonês são mais elegantes e, à medida que o tempo passar, também ganharão maior valor histórico. Numa altura em que “dizer olá ao novo e adeus ao velho” se foi tornando num dogma, Kazuya questionou esta ideia através da organização de seminários e de visitas guiadas a fábricas, permitindo que a nova geração ficasse a saber mais sobre as artes e os ofícios tradicionais de vários pontos geográficos do Japão e que os produtos artesanais chegassem a diferentes públicos.


“Feito à mão no Japão” é uma parceria entre artesãos de Quioto e o estúdio de design dinamarquês OeO e tem como objectivo criar novos designs com base no artesanato tradicional. OeO consegue captar a beleza do artesanato e dar uma nova vida a cada peça tradicional. Por exemplo, o que é interessante no kanaami (redes com arame) é a sensação espacial que transmite. Estas redes são produzidas com fios metálicos e delicados. Inspirado por esta técnica de tecelagem, o OeO cria candeeiros para o Kanaami-Tsuji, um estúdio de kanaami em Quioto. O novo produto não só mantém a estética da rede de arames, como também cria um contraste maravilhoso entre a luz e a sombra devido ao seu design.


No Japão, não há falta de lojas de acessórios ou de lifestyle. Uma das minhas preferidas é a D&Department, fundada por Nagaoka Masaaki. Com filiais em dez cidades japonesas, o estabelecimento vende uma gama variada de produtos do dia-a-dia como louças, talheres ou utensílios de limpeza. Grande parte dos objectos é produzida em pequenas fábricas familiares. Para ser honesto, se a loja não vender estes produtos, as pessoas da minha geração ou de gerações mais recentes jamais poderão entender por que razão é que são tão especiais e bons. Mas, graças a Nagaoka, estas peças ganharam uma nova vida e, em vez de se tornarem produtos artísticos extintos, voltaram a relacionar-se connosco.


Não posso deixar de perguntar, quais são as coisas que mais apreciamos nas cidades onde vivemos e que não queremos que desapareçam? O que podemos fazer para as preservar?