Lam Sio Man

Nascida em Macau, atualmente a viver em Nova Iorque. Dedica-se a exposições independentes, à escrita e ao trabalho em educação artística. Em 2019, foi curadora da Exposição Internacional La Biennale Di Veneza, inserida nos Eventos Colaterais de Macau, China. Trabalhou no Departamento de Assuntos Culturais da cidade de Nova Iorque, no Museu dos Chineses na América e no Instituto Cultural do Governo da RAEM. É licenciada pela Universidade de Pequim em Língua Chinesa e Artes, e mestre em Administração de Artes pela Universidade de Nova Iorque.

A boa educação em arte que perdemos durante estes anos: sobre educação artística (1/2)

31a edição | 02 2019

Nas sociedades chinesas, quando se fala em educação artística, pensa-se instantaneamente em coisas como a nobreza extraordinária, moldagem de temperamentos, culto da estética e educação moral. 


Como a própria arte, na realidade, a educação artística é considerada um símbolo das classes ricas ou apenas decorativa e não essencial. Para tornar a educação artística parte da vida das crianças, é necessário aumentar a nossa consciencialização sobre educação artística e relacioná-la com a nossa vida quotidiana.


O sistema de educação artística nos Estados Unidos da América (EUA) é sempre considerado um bom modelo. Mas, depois de trabalhar no departamento de educação artística, descobri que, embora tenham uma estrutura e um conjunto de indicadores (como os Padrões de Aprendizagem das Artes do Estado de Nova Iorque) para a educação artística nos EUA, eles apenas dão orientações. Com excepção da música, outras áreas artísticas não são disciplinas nucleares. Apenas as escolas que realmente valorizam a educação artística ou que recebam financiamento do governo oferecerão disciplinas de arte aos alunos. Dito isto, a educação artística precisa responder a muitas exigências práticas. Por exemplo, muitas crianças chinesas aprendem a língua e a cultura chinesas através do estudo da arte. Algumas crianças de famílias imigrantes aprendem inglês estudando teatro. Em tais casos, a arte tornou-se a ferramenta para estudos de língua e cultura e uma porta de entrada para aprender culturas. Na maioria dos casos, a arte e outras disciplinas, juntamente com o objectivo da educação, complementam-se mutuamente e desenvolvem-se de forma abrangente.


Desde que trabalho na área da educação artística, entrei em contacto com muitos professores de arte e fiquei a saber mais sobre a programação de disciplinas práticas e os métodos de ensino. Certa vez fiquei impressionada num workshop quando a Angela, uma experiente professora de dança, contou como ajudou estudantes a estudarem sociologia através da aprendizagem de dança africana. Pedindo aos alunos que localizem diferentes regiões da África, mostrando algumas imagens das bandeiras dos países africanos e apresentando o estilo de vida e os festivais tradicionais, os alunos podem observar e discutir a correlação entre música, dança e cultura tradicional em África. Através desse processo de contemplação, os estudantes desenvolveram espontaneamente interesse em aprender. Começaram a aprender movimentos de dança simples e chegaram mesmo a produzir as suas próprias coreografias, apreciadas pelos colegas.


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Angela, professora de dança, educa os alunos 

     sobre a geografia e as sociedades africanas 

     ensinando danças africanas.


O método de ensino de Angela incentiva os alunos a relacionar o conhecimento que aprendem na sala de aula com a vida quotidiana, a pensar de forma independente e a melhorar a criatividade. Ela ensina numa escola primária há anos. Respeitada e adorada tanto pelos alunos quanto pelos professores, a aula de Angela é muito popular na escola e todos os alunos a escolhem. Outros professores de arte e eu mesma achámos a experiência na aula de Angela absolutamente encantadora e beneficiámos muito com isso. A pergunta a ser feita é por que é a sua aula tão bem-sucedido nesta escola e por que um curso de dança projectado para alunos do ensino primário também pode beneficiar adultos? Acho que a resposta possível é que ela não ensina apenas conhecimento, mas também incentiva os alunos a explorar e a criar mais; através de partilhas e de discussão, da aprendizagem mútua entre colegas, os alunos podem até inspirar o professor de tempos em tempos. Além das formas e conteúdos da arte serem ensinados na sala de aula, outros componentes da arte relacionados com o nosso quotidiano, cultura, sociedade e história também são discutidos. Se as nossas crianças pudessem receber educação artística desta maneira, a sua capacidade de pensar independentemente, a sua criatividade e gosto pela arte, e sua capacidade de interpretar o mundo seriam diferentes.


Nas regiões de língua chinesa, as aulas de belas-artes, de caligrafia e de música são comummente oferecidas pelas escolas, sendo que na maioria das vezes somos obrigados a memorizar o conhecimento e a imitar sem reflectir criticamente sobre o conteúdo. Raramente contemplamos e nos expressamos com a ajuda da arte. É verdade que quando os estudantes chineses estudam no exterior tendem a ser insuficientes no que toca ao pensamento independente, já que o nosso sistema educativo não nos treina para tal, já para não falar da capacidade de fazer um julgamento e ser-se criatividade quando se trata de estética. 


Parece que fomos além da discussão sobre educação artística ao reavaliar o sistema educativo. Como o problema de “ter a papinha toda feita” é isso estar carregado de banalidade, promover a educação artística pode ser um bom começo para incentivar os alunos a pensar de forma independente e inovadora.


Padrões de Aprendizagem das Artes do Estado de Nova Iorque: www.nysed.gov/curriculum-instruction/arts-standards-implementation-resources